Talvez não fosse um ícone daqueles que costumam habitar regularmente as capas das revistas mais focadas na nostalgia da cultura pop/rock. Mas não se conta a história da música americana sem se falar de Robbie Robertson. Nascido em Toronto (Canadá) em 1943, era ainda um jovem adolescente quando se deixou encantar pelo mundo dos espetáculos itinerantes e pela música que ali se escutava. Filho de uma mulher com ascendência cayuga e mohawk e espectador de uma complexa trama familiar (com os primeiros anos vividos a pensar que o seu pai era outro), Jamie Robertson encontrou o nome artístico no robot de Forbidden Planet e, depois de primeiros trabalhos de verão em grupos itinerantes, começou a integrar bandas a partir de 1957, passando, entre outras, pelas formações dos Robbie and the Rhythm Chords, The Suedes, Ronnie Hawkins and the Hawks ou, com parte da formação comum, os Levon and the Hawks, ao lado do baterista Levon Helm, parceiro-chave no processo de evolução de esforços coletivos que acabaria por gerar a formação dos The Band e, com eles, importantes bases para a afirmação de uma nova maneira de encarar heranças de músicas de raíz norte-americanas com a progressiva evolução de linguagens da música elétrica.
Há um momento “eureka” a ter em conta na história de vida de Robbie Robertson. E tem a ver com o convite que lhe é feitio por Bob Dylan quando este começou a imaginar uma visão elétrica para o seu som. Robbie começou por levar consigo Levon Helm, partilhou palcos com Dylan e colaborou na gravação de Blonde on Blonde. O “salto” maior ganha forma pouco depois quando, no período de convalescença do célebre acidente de moto, Dylan passa uma temporada em Woodstock onde chama músicos, entre os quais Robbie Robertson e os demais parceiros em breve cantariam o seu grito do Ipiranga para, por si mesmos, criar os The Band. É contido nas míticas sessões gravadas numa cave em Woodstock, que emergiram como disco de Dylan já nos anos 70 como The Basement Tapes que se define a base de trabalho que não só define esse espaço de trabalho partilhado como sugere um rumo para uma vida própria daquele grupo de músicos que, não avançam com Dylan para a gravação de “John Wesley Harding” (1967) e se estreiam como The Band, em 1968, com Music from Big Pink (título que ainda alude à casa onde decorreram as míticas sessões em Woodstock).
Com os The Band Robbie Robertson define uma obra marcante que é gravada em disco entre a estreia em 1968 e Moondog Matinee, disco de 1973 integralmente feito de versões, entre ambos surgindo The Band (1969), Stage Fright (1970) e Cahoots (1971). Está naturalmente presente no célebre concerto que assinala a despedida da banda (na verdade dessa etapa de vida da banda), no qual é rodado o filme-concerto The Last Waltz, episódio que assegura uma primeira parceria com Martin Scorsese, realizador com quem acaba por definir uma série de trabalhos de colaboração, desde a produção musical à composição, e que lhe abre portas para um recorrente espaço de trabalho para cinema que se acentua nos anos 90. Depois da despedida dos The Band (aos quais não voltou) focou sobretudo trabalhos de colaboração, ora tocando guitarra (nomeadamente num reencontro com Dylan) ora como produtor. Trabalhou ao lado de nomes como Joni Mitchell ou Neil Diamond, mais tarde Tom Petty ou Ryuichi Sakamoto. E a partir de 1987 assinou uma obra em disco que se estende ao longo de seis álbuns de estúdio, no primeiro tendo surgido o clássico Somewhere Down the Crazy River, em 1994 surgindo com o Red Road Ensemble em Music for the Native Americans onde abordou as suas próprias raízes. O seu trabalho multicafetado incluiu ainda uma frente de ação como editor discográfico.
Texto de Nuno Galopim
Nuno Galopim assinalou as mortes de Robbie Robertson e Sixto Rodriguez nas manhãs da Antena 1. Ouça aqui este momento: