Já chegou às livrarias o perfume deste livro, “Chuva de Jasmim”, de Shahd Wadi, que Alexandra Lucas Coelho admite ser o primeiro livro palestiniano da poesia portuguesa. Se deixarmos que o olhar e o coração sejam tatuados pelos poemas deste livro podemos escutar o vento das vozes que lhe sussurraram um segredo, no Egipto onde nasceu: “és palestiniana”. Ela é, entretanto, tão portuguesa como eu e tu, não apenas porque vive nestas ruas desde 2006, mas também porque nesta língua nossa pátria comum se fez doutora em Coimbra, rasgando, inovando, indo adiante, decifrando em voz alta corpos de mulheres palestinianas que transporta na trouxa. Quando ela escreve, as palavras exalam um perfume de planta trepadeira, um perfume que vai mais alto puxar a chuva de jasmim sobre nós, em aguaceiros cantantes.
Shahd Wadi convoca-nos esta noite para a Casa do Comum, na rua da Rosa, em Lisboa, onde nos surpreenderá com um suave dilúvio de palavras abertas em cálice de flores tubulares.
O perfume da chuva de jasmim espalha-se sobre o chão semovente que é o seu lugar e o seu destino, um tapete de chão palestiniano, entre outras possibilidades. Palestiniana nascida no Egipto, Wadi viu crescer a infância na Jordânia, cravo, buganvília, jasmim de todas as revoluções. Não poderás domar as palavras encantadas que escutarás rua da Rosa.
A palavra poética de Shahd Wadi espalhará a chuva de jasmim sobre a Palestina, entre outras possibilidades.
Em quantas línguas sonha Shahd Wadi? Que pátria é a sua? De que exílio nos fala esta poesia? Não ousemos perguntar-lho. Os versos dela podem responder-nos: “Sou o toque entre duas peles. Na linha que nos separa eu habito”.
Não nos iludamos quando o poema pareça insinuar um travo de chá de menta. Essa delicadeza é uma tisana contra os amáveis equívocos. Ela gritará adiante, quando os seus versos desencadearem uma chuva de jasmim. Nesse momento as palavras hão-de chicotear-nos como bátegas. Ou como rockets.
As palavras, casas em pó.
Não lhe peçam cartão de cidadã. Ela é palestiniana, entre outras possibilidades. Ela é a própria fronteira. Evitai perguntas imprudentes. Ela pode devolver-vos as perguntas com travo de chá de menta, como neste poema do livro “Chuva de Jasmim”:
“Que bebe esta menina árabe exótica de pele escura, / com nome mais longe do que o mar, e língua / afia
da e desafinada? / Medronho, respondi”.