Há cem anos, nascia um dos maiores poetas que o
Brasil já conheceu. Vinicius de Moraes deixou a sua marca na MPB, sendo
eternamente lembrado como um dos grandes letristas da Bossa Nova.
Os seus clássicos estão marcados no imaginário de
todo o povo brasileiro e não há como falar de amor sem falar de Vinicius.
Como forma de homenagear o centenário desse
génio da Bossa Nova, o produtor musical Zé Milton reuniu os maiores nomes da
música popular brasileira para interpretar os mais importantes clássicos do
poeta. Entre os convidados estão, Chico Buarque, Seu Jorge, Raimundo Fagner,
Nana Caymmi, João Bosco, Toquinho, Zeca Pagodinho, Ana Carolina, Arlindo
Cruz entre outros. O resultado desses convites são regravações inéditas e
surpreendentes.
"A Vida Tem Sempre Razão" é item obrigatório nas colecções de
quem gosta de boa música e de poesia.
Por Joaquim Ferreira dos Santos
"As comemorações do centenário de Vinicius de Moraes
recebem o songbook definitivo da efeméride, uma coleção de algumas de suas
músicas mais conhecidas através de amigos de geração e artistas jovens, que
continuam renovando a obra do "poetinha".
São 16 faixas inéditas e duas bônus track. De Chico
Buarque a Seu Jorge, estão todos presentes em A Vida tem sempre razão. A
produção é de José Milton. Georgiana de Moraes idealizou o projeto.
"Entre os mais antigos, procuramos artistas que
tivessem participado de projetos com Vinicius", diz Georgiana, "e entre os mais
jovens, aqueles que certamente estariam na turma dele, se ele ainda estivesse
por aqui".
Um dos critérios de seleção de repertório foi
contemplar todos os parceiros mais importantes de composição, como Tom Jobim,
Carlos Lyra, Baden Powell, Edu Lobo, Francis Hime e Toquinho. As músicas foram
selecionadas em comum acordo com os intérpretes que, apesar do elenco all star,
foi fácil de reunir. "Todos toparam na hora", diz Georgiana. "E o clima no
estúdio era repleto de histórias do relacionamento deles com Vinicius". Edu
Lobo, por exemplo, contou a história de como compôs "Só me fez bem" com ele,
numa festa em Petrópolis. Edu, jovem, disse ter ficado tão excitado com aquilo,
um texto inédito do grande mestre, que, para não perder a letra, colocou-a
dentro do sapato.
Segundo Zé Milton, o conceito do disco é "a exaltação
da beleza, da elegância, da harmonia perfeita. Procurei não desestruturar
coisas tão delicadas, não inventar em cima do que já está muito bem acabado.
Segui a máxima do Vinicius: ‘Beleza é fundamental’. Acho que deu certo".
As faixas:
"O amor em paz", com Chico Buarque – Inicialmente, a
ideia era que Chico gravasse uma das músicas que compôs em parceria com
Vinicius ("Desalento", "Valsinha", "Gente humilde"…), mas ele preferiu "O
amor em paz", inédita em seu repertório. Chico, repare só, está cantando cada
vez melhor.
"Chega de saudade", com Zeca Pagodinho – A música, que
começou a bossa nova em 1958, ganha uma versão mais acelerada, revelando o
samba que já havia por baixo da gravação clássica de João Gilberto. A bossa
nova não tinha uma dança própria, mas aqui, com Pagodinho, o clima é de
gafieira, com muitos metais ao fundo. Vinicius pagodou geral. No final, Zeca
abre o jogo e encaixa uma frase nova nos versos: "E cantar samba de Vinicius
sei que é muito bom pra mim". Pra todos nós. O arranjo é de Cristóvão Bastos.
"A felicidade", com Joyce Moreno e Roberta Sá – Joyce,
quando ainda estava na dúvida se abandonava o jornalismo, deu seus primeiros
passos na carreira artística sob a bênção de Vinicius. Desde então, apesar da
diferença de idade, ficaram muito amigos. O compositor é presença certa nos
shows internacionais de Joyce, que nesta faixa se junta a Roberta Sá, de uma
nova geração de cantoras, para renovar um dos maiores clássicos da MPB. Atenção
para o violão de Joyce.
"Janelas abertas", com Nana Caymmi – Quem mais, além
de Nana, para cantar versos que falam em "casa sombria" e o desejo, ao fim de
um caso de amor, de morrer para tudo "serenizar"¿ Outros cantores poderiam se
descabelar. Na voz de Nana, o drama fica na elegância exata.
"Canto triste", com Edu Lobo – A densidade melódica é
uma das marcas da parceria de Vinicius e Edu, que percorreu boa parte da década
de 1960. "Canto triste", que Elis Regina defendeu no I Festival Internacional
da Canção, de 1966, da TV Globo, recebe releitura ainda mais comovente, com um
lindo solo de Carlos Malta no sax alto.
"Onde anda você", com Maria Creuza – O disco é um
encontro de Vinicius com seus companheiros de viagem, e Maria Creuza
literalmente viajou muito com ele. Na companhia ainda de Toquinho, fizeram uma
espécie de trio que percorreu vários países da América Latina, resultando num
disco gravado ao vivo em Buenos Aires. "Onde anda você" estava sempre no
repertório.
"Você e eu", com Carlos Lyra – O charme desta faixa é
a participação de Marcos Valle ao piano. Vinicius sempre foi muito generoso ao
citá-lo, mas nunca chegaram a compor ou trabalhar juntos. Este "erro" da
História é consertado aqui, com o piano de Marcos realçando o balanço natural
da canção, um clássico da bossa nova.
"Samba em prelúdio", com Miúcha e Renato Braz – Ela já
fez um disco inteiro apenas com canções de Vinicius, escolhendo principalmente
as mais desconhecidas. Ele, um dos cantores mais interessantes das últimas
gerações, é um estreante no repertório do compositor. Encontraram-se nesse
dueto criado por Vinicius para que a voz feminina e a masculina celebrem a
saudade amorosa.
"Medo de amar", com João Bosco – Só, ao violão, João
inventa na introdução um outro instrumento com a voz. Ele conheceu Vinicius
quando estudava engenharia em Ouro Preto, numa reunião na casa do pintor Carlos
Scliar. "Medo de amar" é das composições em que Vinicius, excelente melodista,
se aventurou sem parceiro.
"Eu sei que vou te amar", com Ana Carolina – Uma
cortina de violinos decora a mais clássica das baladas de Tom e Vinicius, a canção preferida dos
noivos brasileiros para entrar na igreja e pedir a bênção divina para a união
dos corpos.
"Chora coração", com Fagner – Muitos não sabem, mas
Fagner assina a parceria, além de ser o cantor, do poderoso "Leão" ("o rei da
criação"), o clássico infantil brasileiro que está entre as músicas do musical
"Arca de Noé", todo com poemas de Vinicius. Em "Chora coração", Fagner rasga o
peito sofrido nesta declaração pungente de dor amorosa.
"Sem mais adeus", com Mônica Salmaso – Mônica estreou
em 1995 com um CD de afrosambas de Baden e Vinicius e no momento percorre o
país com um show também em sua homenagem. Afinadíssima, técnica, ela grava pela
primeira vez "Sem mais adeus", que consta do repertório do seu novo show.
"Consolação / Formosa / Pra que Chorar", com Arlindo
Cruz e Moiséis Marques – Os três sambas de Baden Powell e Vinicius, lançados
por Ciro Monteiro nos anos 1960, abrem a roda deste disco. Arlindo, nos
terreiros do pagode carioca desde os anos 70, e Moiséis, cantor nascido com a
turma que renovou a Lapa a partir dos anos 90, cantam juntos pela primeira vez.
O clima é de roda de samba, com os violões de Claudio Jorge e João Lyra em
destaque.
"Canto de Ossanha", com Seu Jorge – Os Afrosambas,
coleção de cantos de Baden e Vinicius a partir de temas da religiosidade negra,
são um dos momentos mais celebrados da música brasileira. Elis Regina, em 1966,
eternizou a canção numa interpretação arrebatada, bem ao gosto daquela época de
festivais. "Canto de Ossanha" agora reaparece atualizada pelo moderno Seu
Jorge e sua voz de malandro cool.
"Cartão de visita", com Georgiana de Moraes – Uma canção
pouco conhecida da parceria de Carlinhos Lyra e Vinicius, "Cartão de visita" é
das preferidas de Georgiana, filha do meio do poeta. O samba foi lançado em
1964, como parte do musical "Pobre menina rica".
"Sei Lá / A vida tem sempre razão", com Toquinho – A
parceria com Toquinho rendeu sucessos nas trilhas da novela, como é o caso
desta música (também conhecida como "Sei lá"). Ela foi feita especialmente para
a trilha de "Nossa filha Gabriela", novela de Ivani Ribeiro, na Rede Tupi de
Televisão, em 1971. Em 2009, "A vida tem sempre razão" reapareceria na Rede
Globo, na abertura de "Viver a vida", de Manuel Carlos.
"Garota de Ipanema", com Emílio Santiago – Emílio
estava escalado para o disco (ia gravar "Tempo feliz"), mas faleceu no início
de 2013. "Garota de Ipanema", escolhida como bônus track, numa gravação feita
em 2000, é uma homenagem ao grande cantor, que mais uma vez dá provas da sua
afinação e balanço. Esta é para dançar. Emílio canta a "Garota" como se
estivesse no conjunto de baile de Ed Lincoln, onde estreou, nos anos 70.
"Pela luz dos olhos teus", com Miúcha e Tom Jobim – As
notas do piano de Tom na introdução são dos momentos mais marcantes da história
da MPB. Esta gravação, de 1977, com a assinatura apenas de Vinicius, é a que
abria em 2002 a novela "Mulheres apaixonadas", de Manuel Carlos.
- O Amor Em Paz – Chico Buarque
- Chega De Saudade – Zeca Pagodinho
- A Felicidade – Joyce Moreno E Roberta Sá
- Janelas Abertas – Nana Caymmi
- Canto Triste – Edu Lobo
- Onde Anda Você – Maria Creuza
- Você E Eu – Carlos Lyra E Marcus Valle
- Samba Em Prelúdio – Miúcha E Renato Braz
- Medo De Amar (Vire Essa Folha Do Livro) – João Bosco
- Eu Sei Que Vou Te Amar – Ana Carolina
- Chora Coração – Fagner
- Sem Mais Adeus – Mônica Salmaso
- Consolação / Formosa / Pra Que Chorar – Arlindo Cruz E Moyseis
Marques - Canto De Ossanha – Seu Jorge
- Cartão De Visita – Georgiana De Moraes
- Sei Lá (A Vida Tem Sempre Razão) – Toquinho
- Garota De Ipanema (Bonus Track) – Emilio Santiago
- Pela Luz Dos Olhos Teus (Bonus Track) – Miúcha E Tom Jobim