Na capa do Público, esta manhã, mais um protocandidato presidencial pondera.
Não se abrem, de espanto, as bocas. Muitos, há muito, vaticinam que, quando chegar a hora, Portas dará o passo em frente.
O texto de São José Almeida alinha argumentos ponderosos em abono de tal possibilidade. Ela avoluma-se na fervura de um descontentamento que a estratégia anunciada por Montenegro para as presidenciais provocou nos parceiros de coligação.
Tantos ponderando há-de querer dizer que nem todos terão sido ponderados na avaliação de possibilidades, próprias e alheias. Nem todos terão ponderado avisadamente a oportunidade com que deixaram escapar para a opinião pública a entrada em vigor de um só aparente estado de letargia. Na verdade, aquele que pondera tem as antenas muito mais acesas, avalia relações de força, não é indiferente ao andamento do mundo.
Há quem imagine os dias próximos futuros dos protocandidatos mergulhados em circunspecção e sisudez, esse estado de elevação que vem com os dentes do siso.
E, contudo, aquele que pondera não está em retiro espiritual, pois trata discretamente da vida. Muita da sua ponderação há-de correr à mesa, entre a análise das sondagens e a convivência lúdica.
Mais do que sabermos se houve imponderação em cada um dos anúncios de entrada em ponderação – essa espécie de estado de prontidão em que se finge de morto – vale a pena ir percebendo o modo como os directórios políticos irão descartando cada nome. Os circunspectos protocandidatos esperarão, mais ou menos em vão, a vaga de fundo, não se sujeitando, contudo, ao pé em falso, ao dó de peito. Não chegarão a desistir. Porque, na longa e muito reflectida hibernação, não deram o passo em frente, não chegaram a avançar.
A ponderação, quanto mais ensimesmada e distante da especulação pública, evitará a desistência, na justa medida em que a intenção se manteve em ponto morto, ao contrário do abandono depois do tiro de partida ter outro penacho dramático.
Sirva de consolo a quantos a ponderação não evite uma entrada e uma saída em falso, as palavras que, no romance “A Paixão Segundo G.H”, Clarice Lispector dedica ao desistente: “A insistência é o nosso esforço, a desistência é o prémio. A este só se chega quando se experimentou o poder de construir e, apesar do gosto do poder, prefere-se a desistência. A desistência tem que ser uma escolha. Desistir é a escolha mais sagrada de uma vida. Desistir é o verdadeiro instante humano”.
Um dia, mais perto do fim da história, tudo ponderado, ganhará o primeiro desistente uma chamada de capa?