A cantora angolana que lança o seu primeiro disco aos 80 anos veio à Antena 1 e conversou com Ana Sofia Carvalhêda.
Garda era a estrela
da música angolana na 2ª metade do século do século XX. O disco homónimo
da artista tem data de edição marcada para inicio de Fevereiro.
A primeira
grande entrevista foi publicada na edição de 8 de Janeiro, no Expresso
(revista Única).
O público que tem
Garda na memória pertence às grandes famílias portuguesas. Conviveram com ela
em Angola, nos anos 50 e 60, e em Portugal, no início dos anos 70.
Abrilhantou todas
as grandes festas e foi convidada para animar o baile de debutantes da família
Espírito Santo, em Lisboa. Nessa altura, depois de aparições na TV e no Casino
do Estoril, grava com sua banda um disco nos estúdios Valentim de Carvalho.
Regressa, e na sua terra natal é editado um single – "Maria Candimba" – o
primeiro disco de sempre editado em Angola.
Para além de 4 temas,
o disco gravado por Garda nunca foi editado.
Quase 50 anos
depois, após muitas peripécias, Francisco Vasconcelos aposta no convite a
músicos de uma geração diferente de Garda para dar novas roupagens às suas
composições. O resultado pode ouvir-se naquele que, aos 80 anos, é o seu álbum
de estreia.
A história de vida
de Garda não pode ser resumida em algumas linhas, pelo que a Valentim de
Carvalho Multimédia preparou um documentário, em fase de produção. Este documentário terminará
com a festa de apresentação do álbum de Garda, 50 anos depois da primeira
gravação nos estúdios Valentim de Carvalho.
"Senti que queria gravar o disco da Garda pouco depois de
a conhecer. A sua irresistível presença, a grandeza como desdramatizou o relato
dos altos e baixos da sua vida e uma maqueta com uma gravação rudimentar de
quatro canções, chegaram para me conquistar logo no primeiro encontro. Senti
que tinha absolutamente que gravar o seu disco.
A edição é um negócio que só se faz bem com paixão. Mas
não deixa de ser um negócio e difícil! Quando me comprometi a avançar,
analisando a decisão pelo lado racional, dificilmente tinha argumentos para
justificar a gravação. O mercado discográfico estava (está) de pantanas, nem
mesmo os artistas consagrados são apostas seguras. Quando todas as editoras
estão obcecadas com a descoberta da próxima teenager popstar, preparava-me para
contratar uma artista que caminhava para os oitenta anos, consagrada por um
esquecimento de décadas. O estilo musical, esse, não podia estar mais longe do
pop instantâneo vendável em toques de telemóvel. Mas sentia que fazer o disco
da Garda era uma oportunidade que não podia passar. E foi muito salutar deixar
a paixão do editor sobrepor-se à racionalidade do negócio.
Não foi fácil – demorou mais de três anos a concluir –
porque a concretização desta gravação desafiava todos os cânones actuais. Na era
do digital, dominar pautas com arranjos para instrumentos acústicos não é para
qualquer um, nem encontrar músicos profissionais que se deixassem guiar pela
sensibilidade da mais velha, nem, tão pouco, conseguir que a atmosfera dos
tempos do vinil invadisse as sessões de estúdio e marcasse a gravação, mas
acabámos por descobrir os cúmplices perfeitos.
Agora sei que não estou sozinho com uma ideia bizarra nas
mãos. A Garda conquistou todos aqueles com quem trabalhou – produtor, músicos e
técnicos – pessoas que hoje partilham o mesmo fascínio por ela. Também eles não
se conformam com o facto de Garda não ocupar na música angolana o lugar que
poderia ter tido; também eles sentem que estão a ajudar a corrigir ou a
reescrever a história, a reparar uma injustiça, para com a artista e para com
música de Angola; e, sobretudo, que a Garda vai finalmente encontrar o seu
público e provar que a decisão irracional seria não aceitar o desafio para
gravar a sua música.
Mais de cinquenta anos depois de uma falsa partida, que
foi a sua primeira gravação para a Valentim de Carvalho, em 1957, é com muita
satisfação que retomamos a carreira discográfica da Garda, ao mesmo tempo que
celebramos os seus oitenta anos. Entre as duas gravações há uma fascinante
história para contar. Mas
essa deve ser ela a contá-la… "
Francisco Vasconcelos