Camané ao vivo com o apoio da Antena 1:
4 concertos especiais têm como ponto de partida o cd “Infinito Presente” de Camané.
Ana Sofia Carvalheda conversou com o fadista.
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DATA EXTRA NO CCB: 10 DE ABRIL
9 e 10 de Abril – CCB
29 Abril – Coliseu Porto
7 Maio – Arena d’Evora
Camané esteve no programa Viva a Música no dia 31 de Março.
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No ano em que se assinalam 20 anos sobre a edição de “Uma Noite de Fados”, Camané regressou com um disco novo.
“Infinito Presente” o título do novo registo de Camané e o seu primeiro disco em cinco anos entrou directamente para o 1º lugar do top nacional de vendas.
Numa sala cheia de amigos e convidados, Camané, apresentou ao vivo, alguns dos seus novos fados do cd “Infinito Presente”.
A Ana Sofia Carvalheda assistiu a este mini-concerto.
Sucessor de “Do Amor e dos Dias”, editado em Setembro de 2010 – pelo meio, editou em 2013 a antologia “O Melhor 1995-2013” – “Infinito Presente”, sétimo registo de estúdio de Camané, será editado no próximo dia 4 de Maio.
A edição estará disponível nos seguintes formatos: "Edição Especial” CD com 17 temas + DVD que inclui documentário das gravações, realizado por Filipe Ferreira; "Edição Standard" – CD com 15 temas; e "Edição Digital" com 17 temas.
Dos temas que compõem “Infinito Presente” destaque para duas composições de José Júlio Paiva, bisavô de Camané (“Conta e Tempo” e “Aqui Está-se Sossegado [fado espanhol] ”), um inédito de Alain Oulman (“A Correr”), um tema de Vitorino Salomé (“Medalha da Senhora das Dores”) e a presença dos “cúmplices” habituais Manuela de Freitas e José Mário Branco.
O título-tema do disco, “Infinito Presente”, é um poema de David Mourão-Ferreira (cujo título original é “Corpo Iluminado, XII”), poeta de referência na obra de Camané.
A par de discos anteriores, “Infinito Presente” conta com produção, arranjos e direcção musical de José Mário Branco que co-assina com Manuela de Freitas a supervisão artística. O instrumental ficou a cargo de José Manuel Neto (guitarra portuguesa), Carlos Manuel Proença (viola) e Carlos Bica (contrabaixo). Com produção executiva de Alfredo Almeida (Becas) e Design de som de António Pinheiro da Silva, o novo disco foi gravado nos estúdios Valentim de Carvalho por Nelson Carvalho, João Pedreira, Pedro Gerardo, Marco Cipriano, Suse Ribeiro e António Pinheiro da Silva.
“Infinito Presente” – alinhamento:
1. OS DOIS HORIZONTES
MACHADO DE ASSIS/ ALBERTO CORREIA, POPULAR [FADO SOLENE, FADO MOURARIA]
2. CHEGA-SE A ESTE PONTO
DAVID MOURÃO-FERREIRA/ JOSÉ MÁRIO BRANCO
TÍTULO ORIGINAL DO POEMA: EQUINÓCIO
3. CONTA E TEMPO
FREI ANTÓNIO CHAGAS [SÉC. XVII] / JOSÉ JÚLIO PAIVA [FADO COMPLEMENTAR]
4. PARAÍSO
DAVID MOURÃO-FERREIRA/ JOSÉ MÁRIO BRANCO
5. MEDALHA DA SENHORA DAS DORES
VITORINO SALOMÉ [FADO MEDALHINHA]
6. PASSASTE POR MIM
MANUELA DE FREITAS/ MIGUEL RAMOS [FADO FREIRA]
7. AO CORRER DA PENA (*)
MANUELA DE FREITAS/ FERNANDO MACEDO DE FREITAS [FADO PENA]
8. QUANDO O FADO ACONTECE
MANUELA DE FREITAS/ JOSÉ ANTÓNIO SABROSA [FADO PINTADINHO]
9. QUATRO FACAS
MANUEL ALEGRE/ ACÁCIO GOMES [FADO BIZARRO]
10. LUME
MANUELA DE FREITAS/ ARMANDO MACHADO [FADO SANTA LUZIA]
11. AI MIRIAM
MANUELA DE FREITAS/ JOSÉ MÁRIO BRANCO
12. DESASTRE
MANUELA DE FREITAS/ JOSÉ MÁRIO BRANCO
13. IV ACTO
MANUELA DE FREITAS/ JOAQUIM CAMPOS [FADO TANGO]
14. A CORRER
MANUELA DE FREITAS/ ALAIN OULMAN [“O PIÃO”]
15. AQUI ESTÁ-SE SOSSEGADO
FERNANDO PESSOA/ JOSÉ JÚLIO PAIVA [FADO ESPANHOL]
16. INFINITO PRESENTE
DAVID MOURÃO-FERREIRA/ JOSÉ MÁRIO BRANCO [FADO BELO]
TÍTULO ORIGINAL DO POEMA: CORPO ILUMINADO, XII
17. TRISTE SORTE (*)
JOÃO FERREIRA ROSA/ ALFREDO MARCENEIRO [FADO CRAVO]
(*) Exclusivos da edição especial CD + DVD e da edição digital.
Discografia:
“Uma Noite de Fados” (1995)
“Na Linha da Vida” (1998)
“Esta Coisa da Alma” (2000)
“Pelo Dia Dentro” (2001)
“L’Art de Camané” (2003)
“Como Sempre… Como Dantes” (2003)
DVD “Ao Vivo no S. Luiz” (2006)
“Sempre de Mim” (2008)
“Camané ao Vivo no Coliseu – Sempre de Mim” – CD + DVD (2009)
“Do Amor e dos Dias” (2010)
“Camané O Melhor 1995-2013” (2013)
“Infinito Presente” (2015)
Aconteceu assim. Não foi planeado como celebração dos 20 anos do primeiro álbum, Uma Noite de Fados, dos 20 anos com José Mário Branco, dos 20 anos em que, ao sair das casas de fado, começou a afirmar-se como a mais importante voz masculina fadista chegada depois do 25 de Abril. Não foi planeado, mas Camané e José Mário Branco não tardaram a perceber que uma temática vinha discretamente infiltrando-se nas suas escolhas, e de forma rasteira, daninha, se anunciava afinal demasiado presente para que pudesse ser ignorada: Infinito Presente, sétimo álbum de estúdio de Camané (que toma o título de empréstimo a um verso de David Mourão-Ferreira), está todo ele ancorado na ideia de tempo. A passagem do tempo, o tempo que é memória, o tempo em que vivemos.
Infinito Presente começou a ser preparado há 20 anos. Nada que ver com factos, mas sim com esta sonoridade que aqui encontramos e que é um contínuo, uma depuração permanente de uma ideia de fado que então começou a ser desenhada entre o fadista Camané, o produtor José Mário Branco e, progressivamente, a letrista Manuela de Freitas, e os músicos José Manuel Neto (guitarra portuguesa), Carlos Manuel Proença (viola de fado) e Carlos Bica (contrabaixo). Uma ideia profundamente enraizada no que há de mais tradicional no fado, numa voz que vai à frente a largar as palavras, a deixá-las pousar no sítio certo; e os instrumentos todos virados para a sua presença, limpando-lhe o caminho.
E este espaço criado para a voz deve-se ao facto de, como diz José Mário Branco, Camané ser “um intérprete excepcional, um talento”. “Tem uma voz bonita mas isso não interessa nada. De vozes bonitas estamos nós fartos e não nos dizem nada. O que interessa, sobretudo no caso de um fadista, é parecido com o teatro: a capacidade de o fadista ser verdade.”
Enquanto (quase) todos os cantores pensam em cada novo disco na forma de dar uma nova pirueta, fazendo da sua discografia uma montanha-russa de jogadas imprevisíveis e truques na manga, no percurso de Camané não há esse afã pela novidade. Em cada álbum há antes um encontro com essa voz cada vez mais funda na sua qualidade interpretativa e na relação com os que o rodeiam. Oiça-se a guitarra penetrante de José Manuel Neto em “Desastre”, a viola tentacular e finíssima de Carlos Manuel Proença em “Quatro Facas” ou o contrabaixo de Carlos Bica quase a cantar em “Aqui Está-se Sossegado” e “Triste Sorte”. Ou o modo como os três empurram Camané para a estarrecedora interpretação de “Chega-se a Este Ponto”, canção de intensa actualidade, cujo título parece o resumo perfeito de toda esta prática de trabalho de refinamento constante de uma linguagem.
“Tratou-se [ao longo deste 20 anos] de criar uma sonoridade que tem que ver com a minha forma de estar no fado”, explica Camané. “Por um lado, tentar nunca desvirtuar o lado do fado tradicional, mas tentando, de alguma maneira, criar uma determinada roupagem que faz sentido pelos poemas que canto. Se olharmos para a história do fado, a forma como as coisas foram feitas também foi assim – de dentro para fora. É engraçado que as pessoas mesmo quando ouvem as introduções [da guitarra portuguesa] já percebem que é o meu trabalho. Sei que mais ninguém me conhece como intérprete como o Zé Mário. Isso dá-me uma confiança enorme e teve uma influência mesmo nos músicos que tocam comigo, a forma como tocam para mim.”
Os álbuns de Camané começam invariavelmente por um telefonema para José Mário Branco. O telefone toca nervoso e ansioso, Camané anuncia a sua vontade de gravar um novo conjunto de fados e depois é recebido em casa do seu produtor. “Ele vem cá a casa, conversamos sobre a vida, tentamos (eu e a Manuela [de Freitas]) perceber como está a vida dele, o que ele tem para dizer às pessoas e começa um primeiro trabalho de ideias de letras.” É nessa altura que começam os três a encostar o ouvido aos poemas, a perceber o que dizem as palavras e de que forma se encaixam naquilo que mexe com o fadista. Depois das escolhas intuitivas, o disco começa a clarificar-se e, de maneira pouco casual mas talvez não propositada, afirma-se uma direcção temática.
“Gosto muito da ideia de um disco ter uma história, ter um tema que acontece mais”, admite Camané. Foi o tempo que ganhou peso nas escolhas dos poemas de David Mourão-Ferreira – um Equinócio transformado em “Chega-se a Este Ponto”, um Corpo Iluminado, XII rebaptizado “Infinito Presente” (em que se canta que “passado e futuro não são nada / só o presente é infinito). Mas o tempo, num sentido de resistência aos anos e à sua capacidade de ser ressuscitado mais tarde, aparece igualmente na gravação de dois fados gravados há quase cem anos pelo bisavô de Camané, José Júlio Paiva. “São dois fados que descobrimos num disco de 1925”, conta. “Havia um coleccionador, o José Moças, que tinha o disco há imenso tempo mas não sabia que o José Júlio era meu bisavô. Um dia, num programa de televisão, disse o nome do meu bisavô e o Moças ligou-me logo a dizer que tinha o disco. Sabia que ele tinha gravado dois discos, mas não conhecia as músicas, nunca tinha sequer ouvido a voz dele.”
Também do inesgotável e riquíssimo baú de Alain Oulman surge ainda mais um inédito, “A Correr”, sobre o qual é aplicado um poema de Manuel de Freitas, de um tempo em fuga.
Mas se há passado nestas escolhas, Infinito Presente afirma um hoje com uma “Miriam” que é “uma espécie de Robin dos Bosques” que se passeia pelas mesmas ruas que percorremos diariamente e que “tenta angariar o máximo de coisas que são importantes para a vida das pessoas”. E que se liga fatalmente ao tal “Chega-se a Este Ponto”, poema tão passível de ser lido como um alarme romântico quanto o som da urgência que invade os nossos dias.
Em cada um dos 17 temas, em suma, abunda aquilo a que Camané chama “uma forma de chegar a casa”. E esse é o feito maior de Infinito Presente e destes 20 anos de parceria com José Mário Branco: a de chegarmos também a Camané como se frequentássemos a sua casa, como se a sua casa fosse também a nossa.