A população mundial, que atingiu recentemente os 8 mil milhões, pode crescer mais 2 mil milhões já nas próximas três décadas, de acordo com estimativas da Organização das Nações Unidas. O aumento da procura de alimentos, com destaque para uma dieta rica em proteínas nos países mais desenvolvidos, coloca uma pressão tremenda sobre os recursos naturais do planeta. Para além disto, sabe-se que cerca de um terço dos alimentos produzidos em todo o mundo são desperdiçados, um valor que a ONU quer reduzir para metade até 2030. Conscientes destes grandes desafios, vários cientistas portugueses estão a trabalhar em projetos que pretendem contribuir para uma alimentação mais sustentável e com menos desperdício. Numa série especial de 10 reportagens, que hoje estreamos na Antena 1 e em podcast, a jornalista Eduarda Maio leva-nos numa viagem por diversos centros de investigação do país.
Nos Açores a ciência procura encontrar soluções para os resíduos do leite. As fibras do leite que não é usado na alimentação humana podem produzir tecidos médicos, pensos biológicos que facilitam os tratamentos e a cicatrização de feridas. O Porto participa num grande projeto europeu que quer encontrar estratégias para fazer crescer o consumo de insetos na alimentação humana. Vamos tentar perceber como se incentiva os cidadãos a consumirem, regularmente, alimentos à base de insetos e a introduzi-los nas receitas de confeção diária em casa. Na Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro estuda-se o melhoramento dos solos, capazes de produzirem alimentos de alto valor nutricional com impacto sobre a saúde humana. Os cientistas cultivaram assim ervilhas, produzindo a partir delas um puré cujos efeitos em termos de saúde estão a ser avaliados nas populações seniores em lares de Vila Real. Ainda pela UTAD, procura-se uma solução para o desperdício de dois terços da couve de brócolo, já que só chega aos consumidores a parte da flor. O caule e a folha, reduzidos a farinha e introduzidos na dieta de ratinhos conseguiram combater a obesidade. Será que também poderá ajudar os humanos?
Mais ao sul, a Universidade de Évora estuda formas de tornar os olivais mais resistentes às alterações climáticas, à subida das temperaturas que favorece a ameaça das pragas. Pela primeira vez foi possível fazer o primeiro mapa nacional de todo o olival que existe no continente, onde está, em que quantidades de produção e com que espécies. No Algarve, o Centro de Ciências do Mar participa no esforço europeu para valorizar mais os produtos marinhos. Tal como as maçãs, só chegam à nossa mesa os mexilhões com determinado calibre. Os que não cabem nesta bitola são incinerados. Quanto alimento se desperdiça? Transformados em farinha, na Galiza, estes mexilhões foram testados na alimentação de douradas em aquacultura no Algarve. Podem vir a ser introduzidos nas dietas de aquacultura quando a sua produção for mais significativa. A pesca do polvo em Olhão é uma das principais atividades piscatórias da região, muito importante para a economia local. No entanto, é preciso monitorizar as populações de polvo da costa, a saúde delas, a capacidade de reprodução e a ameaça que sofrem de outras atividades humanas. O Instituto Português do Mar e da Atmosfera está a trabalhar com as comunidades piscatórias a montagem desse sistema de vigilância em tempo real, que procura equilibrar as necessidades da atividade humana com a defesa da biodiversidade marinha.
Na Universidade de Lisboa criam-se sensores que conseguem monitorizar os níveis nutricionais das frutas em crescimento nos pomares e noutras culturas. Além de sabermos mais sobre o estado das culturas a cada momento e das suas necessidades, torna possível cultivar com o mínimo de desperdício de solo e de água. Um projeto que olha já para os tempos difíceis da escassez dos solos agrícolas, com o aumento da população mundial, e da privação de água com as alterações do clima. É a chamada agricultura inteligente. Também pela capital, estuda-se a sustentabilidades das refeições nas cantinas escolares. Menos carne, mais legumes, com a substituição de uma parte das refeições tradicionais por refeições de base vegetal. Que estratégias podem ser seguidas para tornar estas refeições apetecíveis e procuradas pelos consumidores? Em Leiria, no Instituto Politécnico, criam-se novos produtos alimentares que incorporem recursos marinhos, como massas secas com algas marinhas. Com valores nutricionais mais elevados do que as massas comuns e adequados às necessidades de cada idade ou aos consumidores mais ou menos sedentários, eis outro exemplo de alimentos amigos do nosso futuro comum.