A Antena 1 está no Azores Burning Summer, eco festival açoriano que, na sua primeira noite, dedicou o palco principal à música de Cabo Verde. O Parque dos Moinhos, no Porto Formoso, será o palco das próximas duas noites do eco festival multi-premiado — o mais recente, em 2024, considerou-o o Festival com “Melhor Contributo para a Sustentabilidade”.
Cabo Verde foi o cabeça de cartaz da primeira noite de festival: Princezito, Mayra Andrade e Ferro Gaita foram os nomes que preencheram o palco principal do Parque dos Moinhos, todos eles trazendo os ritmos do arquipélago. Antes de qualquer um destes pisar o palco, no entanto, o DJ Novo Major, alter-ego de José Moura, co-fundador da loja de discos FLUR e co-fundador da editora PRÍNCIPE abriu as hostilidades com um DJ Set que homenageou clássicos da África lusófona e também da disco afro-americana, lançando o mote para a noite. Vozes como a da diva da música negra, Ann Pebles, misturaram-se com os sons da natureza e ritmos mais experimentais, que refletiam o espírito e mesmo a localização do Festival que, para além de uma vale que nos dá a vista para o mar, tem um pequeno tesouro escondido do lado oposto — a belíssima cascata do Moinho está lá para quem a quiser visitar.
Princezito foi o primeiro a pisar o palco “principal” do Parque dos Moinhos. O público, inicialmente tímido, soltou todas as amarras depois de um pedido especial: “Está aqui gente? Vamos dançar?”. Dançou-se. Princezito falou crioulo, aproximou dialetos e misturou géneros musicais: “Vivi durante 8 anos em Cuba e apanhei referências de tudo o que se fazia lá: desde músicas afro-cubanas e vários outros ritmos. Em Cabo-Verde, aprendi muito cedo o ritmo de todas as ilhas, mas o meu empenho era tentar resgatar a tradição oral que já estava em agonia: o batuku, o finason. Depois de trazer isso à tona, comecei a fazer nos espetáculos coisas que eu sempre gostei, introduzindo um percurso para o jazz, blues, o blues cabo-verdiano, o merengue e o afro-beat”, disse o músico à Antena 1.
Numa noite em que a união foi rainha, aquela que se deu entre Mayra Andrade e Princezito foi das mais singelas. “Eu costumo dizer que a Mayra é a voz da minha caneta. Ela canta muito bem e às vezes a escrever eu ouço o som das minhas letras na voz da Mayra”. Por isso, não se estranhou quando os “descendentes” do pedagogo cabo-verdiano Orlando Pantera partilharam canções e palco —Princezito deu voz “Tan Kalakatan”, canção escrita por ele mais comummente ouvida na voz de Mayra; Princezito subiu ao “reEncanto”, formato em que Mayra transforma as suas canções, algumas com quase 20 anos, num formato “muito despido, muito puro”, com a voz de e violão de Djodje Almeida.
“Esta é exatamente a Mayra Andrade que é. Talvez seja o projeto em que o público consiga perceber a minha essência de forma mais límpida e clara”, disse-nos a artista que, neste formato inaudito, encontra maturidade. Para fechar o concerto, uma versão de “Téra Lonji” dedicada a Amílcar Cabral, cujo centenário celebra-se este ano, e que Mayra descreveu como “o pai da nossa nação, da nossa independência”.
De seguida, DJ Milhafre, natural de Ponta Delgada, aqueceu a pista de dança com canções que quebram barreiras: houve espaço para José Pinhal, a “Mázia” de Ana Moura, e claro, um bom funaná que, depois de começar não cessou. Os Ferro Gaita subiram a palco e não deixaram cair o bastão, trazendo o melhor dos seus 28 anos de carreira.