1.
A TVI prepara a estreia de uma série sobre o arquiteto Tomás Taveira.
Nada contra.
A sua história, a história das suas violações e procedimentos, podem e devem sustentar documentários, filmes e séries. Até prova em contrário acredito que este projeto possa ser socialmente útil.
Veremos.
2.
No entanto, também pode acontecer o contrário.
Também pode ser que Tomás Taveira seja retratado como uma figura que… no fundo no fundo… é diferente de todas as outras.
Um homem que se fez a si próprio.
Que se tornou um dos arquitetos mais reconhecidos tendo vindo de baixo, uma criança curiosa e inquieta nascida numa família pobre e inculta.
Um jovem que comeu o pão que o diabo amassou e que talvez seja essa a explicação para a sua perversa amoralidade.
3.
Também pode ser que a série crie uma narrativa que acomode Taveira, que o compreenda, que lhe ofereça uma redenção qualquer.
Se isso acontecer será uma vergonha.
Porque Tomás Taveira foi um violador e um crápula.
Filmou mulheres, sem o seu consentimento.
Não parou quando elas lhe pediam para parar.
Disse-lhes coisas horríveis, tenebrosas, de vómito.
E o país comprou as revistas.
Fez circular cassetes piratas.
E o homem, o arquiteto, continuou a trabalhar.
E muitos de nós riram da situação, desvalorizaram-na, alguns até piscaram o olho numa aceitação tácita de que homem que é homem só pode sentir inveja por não estar na situação de Taveira.
4.
O arquiteto está vivo.
Tem 85 anos, dois filhos, provavelmente netos.
É horrível para eles, uma vergonha e não posso deixar de me solidarizar – não têm culpa alguma.
Mas Tomás Taveira não merece uma redenção pública.
Não merece condescendência.
Ser publicamente condescendente é arrasar por completo a hipótese de pormos cobro à animalidade que todos os dias continua a ser notícia.
E isso é intolerável e agoniante.
Texto e programa de Luís Osório
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