1.
Não é a primeira vez que Clara de Sousa fala das suas sombras.
Gosto quando o faz.
Identifico-me quando alguém transforma as sombras em luz.
E respeito ainda mais quando quem o faz tem uma carreira como ela. É mais fácil quando nada se tem a perder, é tudo mais difícil quando o mediatismo obriga a maioria de nós a limar o que não parece ficar tão bem na fotografia.
2.
Clara é uma estrela.
Mas não há dia em que não volte com a memória aos dias em que os pais tudo faziam para lhe garantir um futuro.
O pai José e a mãe Eugénia, mouros de trabalho, a saírem quase de madrugada e a regressarem já depois da hora dos telejornais.
Ela aprendeu a ficar sozinha, a falar consigo própria, a ler e a observar o mundo com olhos curiosos.
E a ajudar em casa.
Eugénia tinha a quarta classe e era cozinheira.
Aos nove anos, a pequena e doce Clara começou a preparar os jantares para os pais. José e Eugénia podiam contar com isso, com o cheirinho que saía do forno quando chegavam a casa.
Uma casa feita com os braços de todos.
Ela própria, menina franzina e bonita carregava baldes de cimento para a construção do telhado.
A vizinhança ajudava e tudo parecia perfeito.
3.
Adoro a maneira orgulhosa como fala dos pais.
Quando vemos e ouvimos tanta gente a maquilhar a sua verdade para parecer bem, é um bálsamo ver e ouvir Clara a ser outra vez menina.
Ouvi-la a confessar que quando cozinha, quando está sozinha a fazer o jantar, volta às memórias de infância…
…talvez lhe ocorra que a mãe Eugénia um dia voltará a pôr as chaves à porta e a elogiar o cheirinho que foge do forno.
Querida Clara de Sousa, obrigado por seres verdade.