Dois cidadãos cuja continuada intervenção mediática decorre de convicções fundas sustentadas numa exemplar dedicação ao serviço público alertam-nos esta manhã para promessas que ficam pelo caminho ou para um tema que não ganha os favores do foguetório de campanha nem espreme meninges nos debates.
A professora catedrática, antiga eurodeputada e antiga ministra Maria Manuel Leitão Marques sugere, no DN de hoje, a realização de um concurso de perguntas entre os espectadores de fora de Lisboa, tendo em vista os debates eleitorais na televisão. “A pergunta mais pedida”, sugere Maria Manuel Leitão Marques, “seria respondida por todos os candidatos”.
A professora imagina-se respondendo a tal inquérito. Ela perguntaria: “Que medidas concretas vão tomar para que Portugal seja um país menos centralizado do que é? Para que o emprego qualificado se distribua melhor pelo território?” Maria Manuel Leitão Marques remete o leitor e os candidatos que talvez escapem a estas perguntas durante os debates que se avizinham para um estudo da Fundação Francisco Manuel dos Santos sobre o impacto da IA e da automação no emprego e “sobre quem beneficia e quem perde com essa mudança”. O estudo concluiu que Lisboa é a grande beneficiária.
O outro cidadão que hoje coloca perguntas só aparentemente periféricas em página de jornal é António Fontainhas Fernandes. O professor catedrático e antigo reitor da UTAD sustenta, no JN de hoje, que as questões de coesão territorial não são preocupação prioritária do poder central. Fontainhas Fernandes chama a nossa atenção para a importância da Linha do Douro na conexão entre quatro patrimónios da humanidade: a cidade do Porto, o Alto Douro Vinhateiro, Côa e Salamanca. Lembra que os municípios da região criaram em 2007 uma comissão para a revitalização da Linha do Douro, que muitas
boas intenções e veementes promessas foram perdendo gás, até que, recentemente, foi dito pelo poder central que a revitalização da linha “não é uma prioridade”. Isto leva o antigo reitor da UTAD a concluir: “Não parece que as questões de coesão territorial sejam preocupação do poder central”. Fontainhas Fernandes estabelece uma relação estreita entre a falta de investimento na ferrovia no interior e o agravamento do esvaziamento do território. Isso leva-o a considerar que o tema deveria merecer discussão pelos partidos políticos e pelos candidatos a novos representantes da região.
Há no texto de Fontainhas Fernandes uma pergunta que poderíamos juntar ao naipe de interrogações de Maria Manuel Leitão Marques: “Será este o país que colectivamente pretendemos?”
Quem ousa responder, mesmo num debate em que estas perguntas não sejam feitas?