1.
Pensei três ou quatro vezes antes de escrever este postal por nada acrescentar.
E quando não se tem nada a acrescentar, quando é difícil encontrar um ângulo novo ou uma distinta abordagem, mais vale estarmos quietos.
É uma regra importante, mas não a vou cumprir por ser mais forte do que eu.
2.
Maria Vieira escreveu sobre o Papa umas horas após a sua morte.
Disse que traíra os valores cristãos por ser socialista e publicou uma fotografia de Francisco com um cachecol LGBT – uma imagem comprovadamente falsa.
Maria Vieira não foi uma atriz qualquer.
Teve um percurso artístico com sucesso popular, trabalhou com alguns dos maiores na televisão e no teatro, viajou bastante e foi amiga de gente inteligente e com princípios, gente de direita e de esquerda.
3.
Maria cresceu numa família preocupada com os excluídos e muito contrária ao Portugal de Salazar.
Não sei muito sobre a sua mãe, creio que se chamava Maria Helena. Mas o pai João era próximo do Partido Comunista e a pequena e talentosa filha seguiu-lhe as pisadas durante os primeiros largos anos de carreira.
Maria Vieira esteve também muito doente, quase um mês em coma.
Os médicos não confiavam que sobrevivesse, mas conseguiu resistir a uma gravíssima septicemia.
4.
Os anos de trabalho como atriz, as constantes viagens que fez, o passado dos pais e a sua experiência de quase morte poderiam ter feito o seu caminho.
Torná-la humana.
Empática.
Séria.
Boa pessoa.
Generosa com a vida.
Mas não foi isso que aconteceu.
Maria Vieira faz-me pena.
Não por ser de direita, era o que faltava.
Há pessoas extraordinárias e luminosas de direita.
Humanas.
Empáticas.
Sérias.
Boas pessoas.
Generosas com a vida.
Aliás, Maria Vieira nem sequer é de direita.
É apenas uma mulher que diz coisas horríveis.
Que é má, perversa, pouco séria.
Não há qualquer luz ali, apenas sombra, ressentimento.
Não consigo compreender, mas tenho pena por ter desperdiçado tudo o que a vida lhe ofereceu.
A vida deu-lhe jardins floridos e ela retribuiu em troca com ervas daninhas e raiva.
Não é destino que se deseje ao pior inimigo.\