Abrangendo, ao longo da sua carreira, diversas áreas artísticas e culturais, como compete a um bom polímato, António Lopes Ribeiro foi um nome central na história do cinema português da primeira metade do século XX. A realização e a produção foram as áreas em que mais se destacou, mas não deixou de ser também crítico de cinema, jornalista, argumentista, produtor, diretor artístico, montador, tradutor, empresário teatral, encenador, radialista e apresentador de televisão. Nascido a 16 de abril de 1908, em Lisboa, António Filipe Lopes Ribeiro (irmão do popular ator Ribeirinho) estudou no Liceu Pedro Nunes e frequentou o curso de Engenharia no Instituto Superior Técnico, que abandonaria, com 21 anos, para ir trabalhar para a revista Sempre Fixe, onde assinou uma rubrica de crítica de cinema, sob o pseudónimo Retardador. Mas com apenas 17 anos já se estreara no jornalismo e na crítica de cinema, sob o mesmo pseudónimo (que usaria pela vida fora), no Diário de Lisboa, com uma página própria (sob a designação de “Arte Cinematográfica – O Claro-Escuro Animado”). Posteriormente, criou e dirigiu as revistas especializadas Imagem (1928), Kino (1930) e Animatógrafo (1934). De resto, manteve, no decurso da sua vida, colaborações com publicações como A Bola, Diário Popular, Cine-Jornal, A Revista de Portugal ou A Rua, entre outras.
Já se estreara, no entanto, como realizador, aos 20 anos, com a curta artístico-documental Bailando ao Sol, que foi um facasso e a que se seguiu o documentário Batida em Malpique. Por essa altura, participou também nas rodagens dos filmes de José Leitão de Barros Nazaré, Praia de Pescadores (1929), Lisboa, Crónica Anedótica e Maria do Mar (ambos de 1930). Todavia, antes disso, fizera uma célebre viagem pelos estúdios de cinema de Paris, Berlim e Moscovo, onde atualizou conhecimentos e colheu influências, contactando com nomes como René Clair, Jean Renoir, Fritz Lang, G. W. Pabst, Sergei Eisenstein ou Dziga Vertov. Trabalhou também em publicidade, chegando mesmo a criar a agência ABE com Chianca Garcia e Bernardo Marques. Entusiasta e defensor do sonoro, ao contrário de muitos dos seus condiscípulos, que viam nele um desvirtuar do cinema como forma de arte, António Lopes Ribeiro realiza, em 1934, com supervisão de Max Nosseck, a comédia Gado Bravo, estreando-se assim na longa-metragem e fazendo o seu primeiro filme com som. O filme reuniu vários técnicos e atores judeus fugidos da Alemanha de Hitler.
Lança-se então, a partir daí, numa carreira que contará com mais de 100 títulos e que só será interrompida no ano maniqueísta de 1974 (por ser visto como artista do regime). Nessa vasta obra, encontramos documentários, adaptações literárias, dramas e comédias. No campo dos documentários, na sua maior parte encomendas do Estado Novo, consegue aliar o rigor histórico a um apurado sentido estético. António Ferro, com um faro ímpar para detetar talentos, desafia-o a filmar uma película sobre a Revolução Nacional de 28 de maio de 1926, por ocasião do seu décimo aniversário. A partir de 1938, na sua nova função de diretor artístico da Missão Cinegráfica às Colónias de África, supervisiona e dirige produções nas províncias ultramarinas. Dessa relação com África nasce Feitiço do Império (1940), ainda hoje um filme de grande escala e com uma trama apelativa. Em 1941, o cineasta cria as Produções Lopes Ribeiro com o intuito de produzir longas-metragens de ficção e filmes de fundo, para além do rol de comédias que marcaram a época áurea do cinema nacional.
Para avaliar o teor prismático do seu talento, basta referir obras de géneros tão distintos como O Pai Tirano (1941), exemplificativo de um certo modelo de comédia portuguesa, e Amor de Perdição (1943), exemplo acabado de como se pode alcançar êxito comercial com adaptações de qualidade de clássicos da literatura portuguesa. De resto, esse pendor policromático e lauto (que contrastava com a sua figura magra e esguia) refletiu-se também numa carreira como homem do teatro (fundou várias companhias teatrais), assim como numa veia de tradutor e escritor (traduziu autores de renome e editou coletâneas de poemas e crónicas da sua autoria). Mas também coube no pequeno ecrã, onde na década de 60 conquistou um público fiel com o seu programa semanal Museu do Cinema, em que fazia dupla com o famoso maestro e pianista “mudo” António Melo. Conotado com o regime deposto, o 25 de Abril de 1974 veio pôr termo à sua carreira e dificultar-lhe a vida. Morreria em 1995, a dois dias de completar 87 anos.
Texto de Nuno Camacho
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