1.
Não sei o nome da criança.
As notícias informaram-nos que tem 12 anos e que foi encontrada, perdida e em lágrimas, a cinco quilómetros de Aveiro.
Estava descalço e eram seis e meia da tarde.
Tinha hematomas no pescoço e a cara num bolo.
2.
A pessoa que o resgatou perguntou-lhe pelo nome e pelo que se passava.
A criança estava perdida, desorientada, em sofrimento.
Fugira de casa da mãe e do padrasto na terra de Requeixo, uma encosta seca, não muito distante da célebre Igreja de São Paio.
Tinham-no agredido por não ter feito as tarefas.
Bateram-lhe sem dó ou piedade, como se não fosse uma criança e cada murro o pudesse salvar da preguiça ou do Diabo que os carregue.
3.
O menino fugiu de casa.
Com a roupa que trazia, com as lágrimas que trazia, com o medo que trazia.
Andou 12 quilómetros descalço.
Perdido e em lágrimas.
Os pés em ferida e alguém, em Aradas, quatro horas após o início da fuga, a encontrá-lo e a perguntar-lhe o nome e o que se passava.
4.
Entre Cabreira e Verdemilho alguém o abraçou e protegeu.
Levou-o para a esquadra e os polícias, depois das perguntas, transportaram-no para o hospital onde, finalmente, adormeceu num sono leve.
A mãe e o padrasto foram identificados e aquela criança de 12 anos, menino que fugiu descalço do horror, espera agora por uma luz que lhe ilumine um caminho de profunda escuridão.
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