O dramaturgo e encenador Tiago Rodrigues, entrevistado no El Pais, retoma, a seu modo, a pergunta brechtiana, “quem construiu Tebas, a cidade das sete portas?”. E o seu modo é este: “Tenho mais perguntas e faço teatro. Se tivesse mais respostas, faria política”. Gosto dos que andam pelos dias com os olhos cheios de interrogações.
A genialidade de Tiago Rodrigues é inseparável dessa fome de porquês que, em parte, terá herdado de Rogério, seu pai, em forma de pergunta. Rogério foi um dos meus heróis discretos, tal como Matos Gomes, querido amigo que agora partiu ao encontro de Salgueiro Maia. Dois bravos em sua serenidade tumultuosa, interrogando-se, também, a seu modo, sobre “quem eram aqueles que foram vencidos pelos césares”.
Em setembro de 67, quando era ainda de esquerda e compadre de Garcia Márquez, que tinha acabado de publicar Cem Anos de Solidão, o peruano Vargas Llosa, que acaba de nos deixar, teve com o colombiano uma longa conversa da qual sairia o livro “Duas Solidões”. A pergunta para qual nunca teremos uma resposta consensual foi feita pelo sobrinho de Tia Júlia: “Para que serve a literatura?”. Foi quase dez anos antes do soco que Vargas LLosa desferiu na cara do compadre, em pleno Palácio das Belas Artes, na cidade do México. A pergunta aguarda resposta que arrume o assunto, tal como aquela, do poema de Brecht, que trata de saber se o jovem Alexandre tomou a Índia sozinho.
O psiquiatra Carlos Amaral Dias, que muita falta nos faz, disse-me certa vez, num estúdio onde os nossos cigarros faziam, com frequência, disparar os alarmes: “Se um político iniciar uma resposta com a expressão ainda bem que me faz essa pergunta não acredite no que ele possa dizer-lhe. Esse político estará apenas ganhando tempo, porque a sua pergunta não lhe vinha a calhar”.
Quando o então capitão Matos Gomes formulava, com os companheiros de armas as perguntas centrais de uma revolução com cravos, a viúva de Neruda publicou o póstumo e belíssimo Livro das Perguntas que o menino Eliécer foi fazendo, em segredo, ao futuro Nobel. Algumas dessas perguntas são tão inesperadas e desconcertantes que nenhuma resposta lhes pode acrescentar valor. Aquela pergunta: “O amarelo dos bosques é o mesmo do ano passado?”. Ou aquela: “Como é que as laranjas distribuem o sol nas laranjeiras?”. Ou aquela: “Onde o espaço termina chama-se morte ou infinito?”.
Algumas vezes sugeri a um ou outro jovem jornalista: “Procura sempre, caso possas, a pergunta cuja resposta ainda pergunte”.
Poucos o fazem tão genialmente como Tiago Rodrigues.