1.
Na mesma semana em que Trump tomou posse e em que Musk nos obrigou a rever tudo o que achávamos ser possível, o mundo recordou o dia em que Winston Churchill morreu.
Fez agora 60 anos que os seus contemporâneos se despediram de um homem único, um anti-herói transformado num dos ícones mais esmagadores do século XX, o homem que com “sangue, suor e lágrimas” criou as condições para que o totalitarismo nazi fosse derrubado às portas do seu paraíso de morte.
2.
Pergunto-me vezes sem conta se as coisas que acontecem são fruto do acaso ou se obedecem a uma qualquer lógica que nos transcende?
Será uma simples coincidência que na semana em que celebramos a maior figura da democracia liberal, sessenta anos
após o dia em que morreu numa manhã de névoa londrina, tenha tomado posse o símbolo maior de um movimento global que pretende destruir a democracia como nós a conhecemos?
Na morte de Churchill estiveram nas ruas mais de um milhão de pessoas e fizeram-se vigílias de pesar em muitas capitais europeias e americanas.
As pessoas choraram-no, mas de uma coisa todas elas tinham a certeza: nunca mais o mundo correria os mesmos riscos, nunca mais ofereceríamos de mão beijada o poder a homens imprevisíveis, ressentidos, lunáticos, fanáticos e antidemocráticos.
3.
Sabemos agora que não é verdade.
O impensável aconteceu.
Donald Trump é o presidente da América.
E Winston Churchill morreu há 60 anos.
Fumava charuto atrás de charuto.
Bebia whisky e gin.
Escrevia num estilo único, era corajoso, culto, megalómano, arrebatado, arrogante, comunicador, excessivo, colérico, absoluto e manipulador.
Era genialmente brilhante.
Pragmático e ainda assim idealista.
Patriótico e ainda assim universalista.
Reacionário e ainda assim progressista.
Partiu num dia em que não foi capaz de acender o charuto em espera na mesa de cabeceira.
Sessenta anos depois de Donald Trump e Elon Musk tomarem posse na arena onde gladiadores os vitoriaram.