1.
Nuno Maulide é um dos melhores portugueses.
Foi um dos mais jovens professores catedráticos na prestigiada Universidade de Viena.
Tinha 33 anos e já conquistara vários prémios – ainda não o de cientista do ano na Áustria em 2019, mas era já uma estrela no firmamento da ciência europeia.
2.
Aborrece-me dizer isto, mas o Nuno é perfeito.
Chateia-me por detestar os perfeitinhos, suspeito deles como o Diabo olha de lado para a cruz, mas nele não consigo ver uma rugosidade – claro que a tem, só que é indetetável aos meus olhos.
3.
Repara, Nuno é licenciado em Química com as melhores notas de sempre no Instituto Superior Técnico.
Completou depois o mestrado em França e o doutoramento na Suíça, tudo com menos de trinta anos.
Quando começou a dar aulas como catedrático em Viena os alunos não queriam acreditar.
É este o professor?
É mais novo do que nós?
Como é possível?
4.
Nuno Maulide é tudo isso.
E foi tudo isso fazendo tudo o resto.
Viajou.
Namorou.
Tocou piano.
Mas não é bem tocar piano.
O professor Maulide toca magistralmente piano, faz recitais para centenas de pessoas, até já ganhou prémios.
5.
Comunica como poucos.
Escreve livros que são best-sellers.
E adora reunir-se à família para comer cachupa feita por Ermelinda, a sua mãe, são-tomense, médica ginecologista.
Feita por ela e por Ibraimo, médico pneumologista, o seu pai moçambicano.
6.
Nuno Maulide nunca sentiu dificuldades por ser negro.
Ouviu algumas vezes o sopro de frases a que nunca deu atenção, viu olhares e bocas abertas de espanto, como se a sua pele fosse pintada, como se não fosse possível ser preto e um génio.
E o Nuno é um verdadeiro génio.
Como académico.
Como professor.
Como investigador.
Como comunicador.
Como pianista.
Como amante da vida.
Como pensador de tolerância, como descodificador da complexidade do mundo.
E depois, para reforçar a minha irritação, vai ao ginásio, corre, é magro, bolas…
Nuno, por favor.
Diz-me o teu calcanhar de Aquiles.
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