O que é um bom momento ou, na versão mais ligeira e utilitária, um momento oportuno?
Esta quarta-feira em que as calculadoras eleitorais dão um pretexto e uma justificação frágeis ao silêncio de Kamala, será o momento propício e oportuno para a publicação de um artigo de opinião assinado por António Costa e por outros dois militantes socialistas com curriculum na definição de políticas públicas inclusivas? Reclama o artigo em página inteira do Público a defesa da honra ferida do PS, em nome de um legado que assenta “nos valores do humanismo, da liberdade, do Estado de Direito, da igualdade e da justiça social”. Fica claro que a honra socialista terá sido ferida de dentro, cada frase é uma farpa visando Ricardo Leão, ainda que o não nomeie. O artigo vai provocar borrasca na bolina táctica dos socialistas. Mas ganhará o favor dos alinhamentos noticiosos?
Um dos signatários é reconhecidamente um mestre da táctica. O que o terá levado a escolher este dia mediaticamente sugado pela cena eleitoral norte-americana para fustigar a alegada grave ofensa de um socialista aos valores, à identidade e à cultura do PS, algo que, escrevem os autores, nenhum “calculismo tacticista” poderá desvalorizar?
A escolha do momento adequado escapa por vezes a quem a intenta. O que é afinal um bom momento? Para efeitos internos no partido a que se destina, a bomba está detonada. E se a urgência da clarificação pretendida é óbvia, dados os valores abalados, nenhum outro calendário se lhe deve sobrepor. Ainda que o secretário geral do partido tenha desvalorizado a circunstância, mais do que a substância, das declarações do agora visado mas não nomeado Leão. “Obviamente não foi um bom momento”, sustentou o secretário geral. Mas há um abismo entre esta legenda e uma outra que acentuasse a suposta honra ferida do partido.
O bom momento será o da oportunidade que a táctica aconselha ou o da urgência que a defesa dos valores impõe?
A pergunta faz todo o sentido, não apenas no caso em apreço. Ao sentir a necessidade de explicar que a ausência do primeiro ministro no Zambujal e na Cova da Moura não foi combinada com Belém, o presidente coloca, igualmente, na agenda o tema da oportunidade e da táctica. Embora não haja aqui, que se vislumbre, qualquer arremedo de defesa da honra.