1.
Ângelo Rodrigues é um popular ator de novelas, um viajante, gosta de trabalhar com crianças – bonito o documentário que realizou com miúdos da Ilha de Moçambique.
Tornou-se conhecido com a novela “Rosa Fogo”; era Estêvão Amorim, um ambicioso projeto de gestor em ascensão.
A novela conquistou audiências e o jovem ator nascido em Gaia tornou-se uma estrela. Desejado pelas fãs e pelos fãs, bem pago por contratos para fazer mais papéis, mais apresentações, mais presenças em lugares onde chegava para ser visto.
2.
A sua vida tornou-se um passatempo para quem observa a vida dos outros – onde também me incluo.
Seguimos o drama da sua dependência de drogas que disciplinavam os músculos do corpo, que os tornavam
indomáveis, que o transformavam no homem que desejava ser – atlético, imparável objeto de desejo ou máquina perfeita, não sei.
Escapou da morte por pouco.
Escapou da amputação de uma perna por menos de um fio.
E quando regressou à vida, após uma longa convalescença, tornou a trabalhar, a viajar, a viver.
3.
Nas últimas semanas, Ângelo voltou a ser notícia.
Pela segunda vez entrara em coma por ter, numa noite de loucura, aspirado o seu próprio vómito.
Estava num hotel de Lisboa e as equipas médicas chegaram a tempo de evitar a sua morte.
Foi noticiado que na origem do drama esteve o consumo de drogas, medicamentos e álcool.
4.
Ângelo Rodrigues ficou uns dias no hospital e mais uma vez os médicos conseguiram resgatá-lo.
Nada do que escrevi me choca particularmente.
Acredito que as pessoas podem e devem ter a liberdade para decidir ou deixar-se ir por um caminho que é o resultado de uma escolha consciente.
O que me choca foi o que Ângelo fez pouco tempo depois de sair do hospital. Vê-lo a entrar de maca num estúdio para ser entrevistado num podcast humorístico é surreal e mais pornográfico do que qualquer versão que tenha sido feita do clássico “Garganta Funda”.
Uma falta de respeito pelos que o trataram – e por todos os que salvam os que insistem em se perder.
Uma falta de respeito pelas pessoas que estavam genuinamente preocupadas, o seu público.
Mas sobretudo uma falta de respeito por si próprio, uma feroz inconsciência ou amoralidade em relação às consequências daquela conversa com Salvador Martinha.
Os miúdos que a viram, alguns cheios de vontade de arriscar ir para fora de pé, outros cheios de vontade de ser estrelas ou bad boys como ele…
…esses miúdos que viram o podcast só podem ter ficado loucos de vontade de experimentar noites loucas como a daquele “grande maluco”.
Porque não haveriam de experimentar se tudo acaba em bem, se tudo acaba em grandes gargalhadas, se tudo acaba com brincadeira, gozo e mais estrelato?
Ângelo Rodrigues pode ser tudo o que quiser.
O que não pode é ser um tipo que arrasta outros pela sua influência – entre o que fez e um tipo que vai bêbado para a estrada e arrasta para a morte quatro ou cinco inocentes, não há diferença nenhuma.
Na verdade, até existe uma diferença.
É que o Ângelo tem mais alcance do que um bêbado na estrada, a sua influência é infinitamente maior.