Faria hoje 100 anos a “rainha do blues“: um título honorífico que não veio por conta de outrem, mas que Dinah Washington concedeu a si mesma. Será sempre redutor destacar apenas um dos estilos em que a artista do Alabama singrou: mais do que apenas no jazz ou no rhythm and blues (R&B), a sua voz é um marco na história da música do século XX. Emotiva, certeira no ritmo, vocalmente poderosa e sem tabus sobre a sensualidade, foi uma influência determinante para Aretha Franklin e toda uma legião de vozes da música negra.
Nasceu a 29 de agosto de 1924. Na sua infância, era ainda Ruth Lee Jones, quando se juntou ao coro local de gospel, na sua igreja. Além da devoção por via do canto, tocava piano; ao crescer e chegar ao liceu, começou a dirigir o coro. A aposta na sua carreira acabou por ser ganha, ao estabelecer-se, nos anos 1950, como força na tabela de vendas de R&B, medida do consumo musical das comunidades afro-americanas. Durante a sua primeira década de atividade – de 1944 a 1954 – apenas três em 31 singles não atingiram o top 10 dessa tabela. Nos anos seguintes, acercou-se do sucesso generalista, que atingiu no ano de 1959, com “What a Diff’rence a Day Makes”, vencedor de um Grammy.
No episódio desta semana do “Gira Discos”, de Nuno Galopim, essa é uma das várias canções que se escutam. Nesse caso, reinterpretada por John Forté, com uma toada reggae, mas há também um confronto da voz de Washington com a música clássica contemporânea de Max Richter. E outros clássicos popularizados por Washington tanto surgem na sua voz como nas de Aretha Franklin ou Patti LaBelle. O episódio observa a rara versatilidade de uma voz que cantou jazz, os blues, música pop tradicional e até o emergente rock, assim como procura pistas entre vários caminhos do seu legado, quer através de versões ou em utilizações recentes de gravações da sua voz em novos contextos.
Um percurso pelo legado da artista que, conforme escreveu Quincy Jones na sua autobiografia, “fez sua cada melodia que cantou. Assim que punha a sua marca soulful numa canção, registava-a e nunca mais seria a mesma.” Morreu aos 39 anos, com uma vida fulgurante e uma obra eterna.