Passam hoje exatamente 35 anos sobre a morte de Maria Leonor, uma das primeiras e mais importantes locutoras portuguesas de sempre e uma das pioneiras e referências da rádio e da televisão em Portugal. Nascida em Lisboa a 6 de setembro de 1920, no bairro da Estrela, freguesia de Santa Isabel, Maria Leonor Leite Pereira Magro tirou o curso dos liceus no Colégio Inglês do Bom Sucesso e o seu aparecimento no ambiente radiofónico deu-se de um momento para o outro, sem ter passado previamente por outras estações de rádio ou por programas mais ou menos amadores que costumam fazer parte da proto-história de radialistas ou artistas. Sem nunca se ter visto diante de um microfone, a locutora foi contratada em concurso depois de um estágio de 15 dias, tendo entrado para a então Emissora Nacional a 4 de maio de 1945, com 24 anos (segundo o primeiro contrato da EN).
Maria Leonor Magro não tinha experiência, mas tinha uma característica melhor: uma intuição natural para estar diante do microfone, com desenvoltura e à-vontade, articulando bem as palavras e sendo fiel aos textos que lhe davam para ler ou interpretar. A partir daí, essas qualidades aperfeiçoaram-se e consolidaram-se, tendo-se revelado uma profissional de excelente calibre. Desempenhou funções de locutora, repórter, entrevistadora, produtora radiofónica e comentadora de moda. Entrevistou, em línguas estrangeiras, para a rádio e televisão, mais de 500 personalidades de nível internacional, tendo sido também a primeira repórter feminina enviada ao Brasil.
Em 1950 gravou, em Londres e em Paris, o disco do primeiro serviço de horas da então designada Companhia dos Telefones, tendo sido o primeiro “relógio falante” do mundo. No magazine Cinema 64 notabilizou-se pelas entrevistas que fez a nomes como, por exemplo, Roger Moore, Dalida, Fernandel ou Sammy Davis Jr. Foi nesse género, a entrevista, que se distinguiu inicialmente, tendo depois passado para apresentadora, intérprete e jornalista, chegando mesmo a receber diversos prémios. Mas o programa de rádio que a popularizou foi Arco-Íris, acompanhada pelo ator Canto e Castro. Chegou também a ser diretora de programas do Canal 1 da RDP.
Além do mais, participou também em teatro radiofónico, atuando ao lado de Vasco Santana, Palmira Bastos, Raul Solnado ou Eunice Muñoz. Maria Leonor colaborou ainda com a RTP e com as principais estações de rádio do mundo, como a BBC, a ORTF, a Suisse-Romande, a Rádio Europa Livre ou a Rádio Belga (mas também várias estações do Canadá e dos Estados Unidos). E trabalhou ainda para a ONU, tendo-se distinguido pela capacidade de luta por causas nobres – fez uso da sua notoriedade para sensibilizar o público para graves questões sociais.
Apresentou programas como Arquivos de Sábado, inserido no contexto das retrospetivas que assinalaram os 20 anos da RTP, e foi também, por exemplo, como intérprete, colaboradora de Olavo de Eça nos conhecidos Diálogos de Domingo. A locutora foi casada com o jornalista e também radialista Pedro Moutinho, tendo um filho que chegou a integrar bandas como os Sheiks ou Delton. Considerava-se uma “socialista ativa, cristã e independente”, mas reconhecia que era uma mulher com “problemas de solidão e sem esperança”. Entre os muitos prémios que lhe foram atribuídos contam-se o Prémio Bordalo na categoria de rádio (que ganhou três vezes), o espanhol Prémio Ondas para melhor locutora internacional, a Medalha de Mérito entregue pela Câmara Municipal de Lisboa ou ter sido feita cavaleira da Ordem do Infante Dom Henrique. O seu papel na história da rádio pode aquilatar-se pelo facto de ter na RDP um estúdio com o seu nome.
Texto de Nuno Camacho
Recorde aqui alguns conteúdos sobre Maria Leonor do universo RTP:
- Um Dia com… Maria Leonor (1970, RTP1)
- Entrevista a Maria Leonor no Venha Tomar Café Connosco, programa apresentado pelo jornalista Jorge Cobanco (1983, RTP2) — primeira e segunda partes