A Casa do Alentejo cumpre hoje um século de existência (este centenário esteve em destaque na última edição do Mortinhos por Sair de Casa, conduzido por Rui Alves de Sousa). A sua história remonta ao ano de 1912, altura em que surgiu a ideia de criar uma espécie de liga que reunisse a “colónia alentejana em Lisboa”. Mas a tentativa inicial não foi bem-sucedida, tendo o mesmo grupo de notáveis que patrocinou a ideia original reiniciado o processo uma década depois, fundando então, a 10 de junho de 1923, o à época intitulado Grémio Alentejano. No entanto, esta designação seria alterada em 1939, por via da legislação então vigente, passando a agremiação a chamar-se Casa do Alentejo.
Após a sua formalização como associação em 1923, esta instituição funcionou numa primeira fase em Alcântara e no Bairro Alto, tendo ocupado em 1932 o edifício que ainda hoje se mantém como sua sede, situado no número 58 da Rua das Portas de Santo Antão, a poucos metros do Coliseu dos Recreios. Mas este edifício, como a própria história da associação, passou por muitas modificações ao longo da sua vida. Da sua proto-história é reconhecido que o palacete original foi propriedade da família Paes de Amaral (viscondes de Alverca), que o mandou construir no século XVII e cujo brasão se pode observar na cornija da fachada principal sobre a janela central. Foi desta linhagem aristocrática que derivou o nome de Palácio Paes do Amaral ou Palácio de Alverca.
Entre 1917 e 1919, o edifício foi alugado a uma empresa que reconverteu uma parte do velho palácio naquele que terá sido provavelmente o primeiro casino da capital, que recebeu o nome de Magestic Club. Sob a direção do arquiteto António da Silva Júnior, o imóvel seiscentista sofreu então uma reestruturação profunda que alterou a sua traça original, sobretudo no interior, passando a exibir uma decoração revivalista definida por elementos neogóticos, neoárabes, neorrenascentistas e neorrococós, acrescida de alguns apontamentos de arte nova. Essa intervenção transformou-o no edifício sumptuoso que se manteve até aos nossos dias. Finda a fase em que foi casino, na sequência da proibição dos jogos de fortuna e de azar decretada por Salazar em 1928, acabou por ser arrendado ao Grémio Alentejano em 1932, que ali fundou a associação regionalista que mais tarde, em 1982, viria a adquirir o edifício, dando início a um novo, longo e dispendioso processo de recuperação do imóvel.
Entre o revivalismo “exótico” e a feição palaciana do Antigo Regime, destacam-se no edifício, entre outros pontos de relevo, o portal de verga reta entre pilastras, o magnífico e “refrescante” pátio hispano-árabe, os salões do restaurante (um com painéis de azulejos do século XX da autoria de Jorge Colaço, retratando cenas rurais como fainas e caçadas, e o outro com paredes forradas com azulejos azuis e brancos resgatados ao antigo palácio) ou aquela que é talvez a mais imponente das divisões, o salão dos espelhos (ao estilo Luís XVI, com mobiliário a condizer, teto e pinturas murais dos irmãos Benvindo Ceia, repleto de lustres e paredes cobertas de espelhos e estuques dourados, e que já recebeu toda a espécie de eventos).
Ao longo de 100 anos, este espaço, que foi classificado como monumento de interesse público, albergou uma escola, um posto médico, uma barbearia, sendo também o lugar “onde muitos se conheceram e casaram”, cumprindo a função própria das casas regionais, ou seja, apoiar de várias formas quem chegava de cidades como Évora, Beja ou Elvas. Tendo desempenhado, no decurso da sua vida, um importante papel na promoção da cultura e do associativismo, a Casa do Alentejo é reconhecida pela sua prolífica (e profícua) atividade no domínio cultural, social, assistencial e recreativo, sempre “ao serviço dos alentejanos em geral e, em particular, dos radicados na cidade de Lisboa e periferia, mantendo uma constante colaboração com as autarquias da capital, de Setúbal e do Alentejo”.
Reconhecida em 1991 como pessoa coletiva de utilidade pública, a Casa do Alentejo acolheu, ao longo dos tempos, na sua luxuriante sede inumeráveis manifestações culturais que contaram com a participação de muitas personalidades públicas, tendo recebido numerosos louvores e distinções, dos quais importa lembrar o Grau de Oficial da Ordem de Benemerência atribuído em 1939 pelo Ministério da Educação Nacional. Importante polo de dinamização, promoção e preservação da cultura alentejana, a Casa do Alentejo foi-se afirmando como espaço cultural polivalente que acolhe múltiplas atividades, eventos e vertentes, tais como apresentações de livros, sessões de poesia, exposições temporárias, conferências temáticas, semanas gastronómicas, concursos em áreas como as artes plásticas, letras ou fotografia, exposições de artesanato, semanas dedicadas aos conceitos do Alentejo ou tardes culturais e bailes sociais (aos fins de semana).
O centenário da Casa do Alentejo é celebrado com um vasto programa de eventos culturais (que já decorrem desde o início do ano) e conta com o alto patrocínio da Presidência da República.