1.
Não é apenas uma miúda muito bonita.
Margarida Corceiro é simpática, esperta, comunicadora e luminosa.
Como atriz, não consigo dizer.
Passaram-me ao lado as duas novelas em que participou e os Morangos com Açúcar.
Tem quase dois milhões de seguidores na sua página de Instagram – vemo-la em lugares de sonho, a publicitar cremes, shampoos, restaurantes, marcas.
Ganha dinheiro a sério, é independente, uma celebridade.
2.
As revistas cor-de-rosa têm-na em todas as edições.
Por gostar de Fórmula 1
Por detestar gatos
Por ter saudades de João Félix
Por não ter saudades de João Félix
Por estar em Nova Iorque ou numa ilha paradisíaca ou em Miami ou em Ibiza
Por se ter voltado a encontrar com um ex-jogador do Sporting
Por ser a nova conquista do piloto Lando Norris
Por Norris afirmar ter várias namoradas.
3.
Margarida é boa naquilo que faz, o problema deve ser meu, mas confesso-te que não consigo entender.
Sei bem o que vende.
Sucesso, beleza, felicidade, prazer, juventude.
Não é coisa pouca, mas pergunto-me acerca deste tempo, deste estranho mundo em que a perceção é mais importante do que a verdade, em que o ter é valorizado face ao ser, em que o sucesso se mede por critérios de consumo rápido.
4.
Se colocássemos Margarida Corceiro e Manuel Sobrinho Simões num centro comercial, a larguíssima maioria reconheceria a jovem e não olharia duas vezes para um dos mais influentes patologistas da história da Medicina e o maior especialista mundial de cancro da tiroide.
E seria a mesma coisa se fizéssemos a experiência com A Pipoca Mais Doce ou a Bumba na Fofinha. Qualquer uma delas teria mais visibilidade e pedidos de autógrafos do que António Lobo Antunes ou Maria Mota.
Não quero fazer juízos de valor, comecei por confessar-te que me sinto a envelhecer.
Mas não compreendo ou não quero compreender.
Lembras-te das críticas que se faziam à Marilyn? Mas a Marylin tinha os filmes e a sua própria tragédia.
Lembras-te da Princesa Diana ser reduzida a uma mera figura cor-de-rosa?
Mas a Princesa Diana influenciou o mundo em coisas concretas – no combate contra a discriminação, no acompanhamento das crianças feridas na guerra, no combate contra a utilização de minas, na dessacralização do poder.
Não gosto de um mundo que se reduz ao alimento que nos mata a fome de imediato, não gosto de um mundo em que as pessoas se reduzem e se contentam em ser um Big Mac para o povo esfomeado de entretenimento.
Precisamos de mais, de ser mais.
Texto e programa de Luís Osório
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