Lembro-me de ter lido há tempos num jornal brasileiro que um mendigo de São Paulo trocara um cachorro por sexo com uma prostituta. A notícia permite imaginar que a prostituta se condoeu do mendigo carenciado ou simplesmente se enamorou do cachorro.
Quantos leitores do JN acabarão por não digo enternecer-se, mas apiedar-se das três mulheres trazidas do Brasil para um apartamento da Areosa no Porto onde foram levadas a prostituir-se por um casal de músicos também proprietários de um canil em Braga?
O repórter Alexandre Panda descreve o osso duro de roer que foi a vida destas mulheres desde a chegada ao Porto em 2018 e 2019. Os passaportes e outros documentos sacados para uma legalização que nunca chegaria, elas foram colocadas numa casa de onde só podiam sair para idas às compras e ao ginásio. Numa dessas saídas, uma das mulheres fez queixa na PJ e a investigação desencadeada permitiu saber que os agora arguidos tinham instalado câmaras de vigilância em todas as divisões do apartamento para controlar os corpos dados ao manifesto. Havia um cofre onde o dinheiro pago pelos clientes tinha de ser depositado. A notícia conta que o casal reteve 467 mil euros às três mulheres, uma verba correspondente a 50% do dinheiro angariado com os serviços de prostituição. Abandono vigiado.
Durante o confinamento provocado pela Covid-19, as três mulheres foram levadas para o hotel canino de Braga onde trabalharam, sem salário, na limpeza de mato. Que canções embalariam a sua vida bruaca?
Li algures sobre um cão que latia entusiasticamente sempre que escutava a canção “Tropicana”, de Alceu Valença.
No canil ou no apartamento da Areosa alguma das três mulheres terá escutado de um cliente amável a palavra jaboticaba ou
outras igualmente saborosas e dançáveis, manga rosa, sapoti, juá, mel de uruçu, morena tropicana, eu quero o teu sabor?
Histórias como esta ajudam a perceber aquele desejo expresso por Mark Twain: “Quando eu morrer espero ir para o cemitério dos cães e não para o dos homens”.
Sai, depressa, ó cão, desta notícia. Deixa-te ficar, “de orelhas engomadas / de remexido rabo ausente!”, no poema em que te colocaram com esses olhos que afligem.
Spot, o cão robô patrulha e vigia, com os seus sensores sofisticados.