1.
Não conheço ninguém como Luísa Sobral.
Bem, não a conheço, nunca a vi, nunca nos vimos.
Mas não há ninguém que me pareça ter tantos precipícios e tanta tranquilidade.
Tantas perguntas e tanto apaziguamento.
Tanta inquietação e tanta necessidade de família, seja isso o que for.
2.
Fala e escreve canções como se tivesse todo o tempo do mundo, como se não tivesse quatro filhos, livros por escrever, espetáculos, entrevistas e encomendas atrás de encomendas para os tantos que lhe suplicam que diga que sim ou que vai pensar nisso, que lhes diga que escreverá para eles.
Quando a ouvimos, a cantar ou a responder a perguntas, passa-nos pela cabeça que talvez tudo seja possível, que talvez possamos ser mais, que talvez nos possamos aproximar um pouco ao que ela nos parece ser…
…uma tempestade num mar calmo.
3.
E depois há o talento.
Já chorei com o “resto das nossas vidas”.
Estava bem, confiante, esperançoso até que a ouvi cantar aquela canção… desabei como se tivesse em mim uma montanha em ruínas.
Mostro o seu “João” à minha Benedita, canção que ela dança como se também estivesse apaixonada por ele numa escola de sonhos.
E “Gosto de Ti”, ouviram?
Seria tão simples se fossemos simples.
Nela tudo parecer ser assim.
4.
Ouvimo-la e regressamos à infância.
A uma leveza perdida num lugar qualquer de que não nos lembramos.
E a escrita?
Já leste o seu romance?
“Nem Todas as Árvores Morrem de Pé” não é passado cá, não é passado neste tempo, não tem a leveza das suas canções, apesar da leveza das cartas de amor dele para ela, palavras de futuro que a esmagam de desejo e a levam a uma viagem sem possibilidade de regresso.
Sim, viajo com a Luísa Sobral.
Também no seu livro estive nos escombros da Segunda Guerra, estive nos dois lados de Berlim, senti o bafo da guerra fria e a desilusão funda de personagens que senti reais, presentes, sobretudo ela, Emmi a quem o amor não salvou, a quem “amar pelos dois” não bastou…
…nunca basta.
Obrigado, sinceramente obrigado, Luísa.
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