Agora que desligaram os pórticos das scuts, talvez nos ocorra ir espreitar aldeias onde não nos lembramos de ter posto o pé ou o olhar. Possa ser esse o pretexto. Por onde começar? Podemos abrir um mapa no ecrã ou procurar pistas na imprensa local ou regional. Talvez essas pistas inesperadas nos revelem alguns tesouros escondidos.
No primeiro dia do ano, o jornal Reconquista revelou-me a aldeia de Palvarinho, no concelho de Castelo Branco e abriu-me as portas da loja da “Menina Maria”, um dos estabelecimentos mais antigos da região.
Nos seus oitenta anos, a casa de Palvarinho, hoje gerida por Paulo, neto de Maria, marido de Isabel, cumpriu as funções de taberna, de mercearia e de posto informal de cuidados de saúde, disponibilizando às aflições mais urgentes a injecção ou outro qualquer primeiro socorro. O neto da menina Maria mantém operacional a velha balança dos dias inaugurais, quase um século de aferição da passagem do tempo por este lugar de mudanças lentas. O balcão é o mesmo, os grandes gavetões permanecem, embora sem o uso antigo, o grão e o feijão já não são vendidos a granel. Do mesmo modo passaram à história os copos de três de um famoso vinho produzido pelo pai de Paulo com a ajuda de um enólogo de afamada cave de Champanhe. O homem de Palvarinho conta que de Lisboa chegavam apreciadores do precioso néctar. Iam de propósito a Palvarinho, onde tantas sedes rimavam com vinho.
Dois grandes cadeirões convidam os clientes e os vizinhos a ficarem um pouco à conversa na loja da “Menina Maria”, desde os tempos em que nem se sonhava com scuts, quanto mais com mapas esticados no ecrã, tão esticados que abrem caminho até ao mais escondido povoado.
Para aqui estou a esticar o mapa em redor de Palvarinho. E eis-me, de repente, em Taberna Seca. São pouco mais de 10 km, indo pela estrada do Penedo Gordo.
Taberna Seca é um altar à sede da memória. Diz-se que o nome desta povoação vem do tempo em que os camponeses das redondezas se juntavam, terminada a jorna, cotovelos no balcão, e conviviam até esgotar o vinho dos tonéis, nesses dias em que as lavadeiras de Taberna Seca ganhavam, nas margens do Ocreza, o direito a uma futura homenagem em azulejos.
Tanto se descobre esticando o mapa no ecrã. Ou indo pelos jornais regionais. Mais se descobre, todavia, metendo pés ao caminho.