1.
O senhor Lourenço recebeu o Dragão de Ouro para sócio do ano do FC. Porto.
Já dele não me lembrava, mas assim que o ouvi no seu trompete foi como se tivesse regressado a um outro tempo.
Justo, muito justo o prémio.
Como justo seria falar do tio Emílio, no Benfica.
Do grande Bessone Basto no Sporting.
Da Melinha, no Sporting de Braga.
Ou até do pequeno Rafal do Vitória de Guimarães.
O desporto só faz sentido assim.
Com alegria e sofrimento, mas sempre com o respeito pelos outros e por nós próprios.
2.
Mas falava-te de António Lourenço, o trompetista do FC. Porto.
Nascido na Sé há mais de oitenta anos e doente pelo clube desde menino.
3.
Aprendeu trompete com um vizinho que tocava clarinete.
E no princípio da década de 1980, por brincadeira, levou o instrumento para um jogo de hóquei em patins do Porto com o Benfica.
Uma equipa de sonho com Franquelim, Vítor Hugo, Realista, Vítor Bruno e António Vale.
Havia tanta gente no Pavilhão Américo Sá que o jogo começou uma hora depois do tempo, mas o Porto foi campeão nessa tarde e as pessoas bateram pela primeira vez palmas compassadas pelo trompete do senhor Lourenço.
4.
Pediram-lhe para ir por que dava sorte.
Pinto da Costa chegou a abordá-lo para que não faltasse nos jogos das Antas. E o bibota Fernando Gomes abraçava-o sempre que o via.
O senhor Lourenço sentiu-se especial e tornou-se a banda sonora do FC. Porto nos últimos 40 anos.
Depois foi desaparecendo à medida que surgiram claques mais agressivas que anulavam tudo à volta.
Foi desaparecendo e agora foi recuperado…
… felizmente ainda em vida.
Um prémio que junta à estátua que tem no Museu do FC. Porto – ele e o seu trompete, imortalizados.
Uma espécie de som do amolador de facas e tesouras que nos preenche a memória de boas sensações.
Quando éramos felizes e não sabíamos.
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