1.
Orlando Ferreira tem pouco mais de setenta anos e foi atleta olímpico nos célebres jogos em que um ataque terrorista palestiniano assassinou onze atletas israelitas.
O jovem Orlando, então com 19 anos, estava com a restante delegação portuguesa no 16º andar do edifício da Aldeia Olímpica de Munique. Foi dessa mesma janela que Eduardo Gageiro fotografou a fuga dos terroristas, imagens que se tornaram icónicas em todo o mundo.
Orlando era judoca e foi eliminado logo no combate inicial por um japonês de mãos grandes e braços largos.
Mas não é esta a história que te quero contar.
É uma história bem melhor.
Uma que verdadeiramente o distingue.
2.
Orlando Ferreira tornar-se-ia engenheiro no Instituto Superior Técnico e começou cedo a dar aulas de Matemática e Estatística no curso de Economia Social, no ISCSP.
Uma licenciatura maioritariamente frequentada por estudantes sem apetência para os números. Largas centenas de miúdos que, na década de 1980 e 1990, se debateram com a dificuldade de completar o curso e entrar no mercado de trabalho.
3.
Orlando notou com preocupação que muitos estudantes desesperados desistiam do sonho de ter um futuro melhor por não conseguirem acompanhar as cadeiras de matemática.
Foi então que, com a autorização da direção do ISCSP e sem ganhar um único cêntimo a mais, deu aulas extra de matemática e estatística aos alunos com maiores dificuldades.
Durante mais de dez anos, sempre aos sábados entre as nove e o meio dia, recebia os estudantes com um enorme sorriso. E no final pedia-lhes para não se esquecerem de fazer os exercícios que ele próprio lhes passava.
Várias centenas de alunos aproveitaram a oportunidade e o Professor Orlando, atleta olímpico e mais tarde administrador da Rodoviária, tornou-se mítico na universidade, de boca em boca corria a certeza de que aquele professor não deixava ninguém cair.
Centenas devem-lhe o seu diploma e a sua carreira.
4.
E fazia mais.
Quando um seu aluno chumbava a Matemática, só lançava as notas depois de todos os exames feitos para que não desmoralizasse.
Nos corredores e na sala de professores alguns colegas “picavam-no” – “Orlando, és demasiado macio para eles e isso não é bom”.
Não concordo.
Claro que foi bom.
Claro que foi aquilo que um professor também deve ser, um orientador de futuro, alguém que tenta, até ao limite, que ninguém fique para trás.
A minha mais sincera admiração.
Disponível posteriormente em Spotify, Apple Podcasts, YouTube e RTP Play.