1.
Durante muito tempo apenas tinha a minha página de Facebook.
Foi lá que nasceu o “Postal do Dia”.
E que a minha proximidade com os leitores se tornou real.
A partir do que fui escrevendo, das partilhas, das mensagens e de tudo o resto, a minha vida mudou, o que não deixou de ser um paradoxo.
Com a minha saída dos jornais e a entrega da carteira de jornalista, perdera a possibilidade de manter uma relação com quem me lia.
Afinal, não perdera.
2.
Não é por isso que hoje te escrevo, mas para te contar de uma insistência que cresceu nos últimos anos.
Tinha de começar a publicar no Instagram porque o Facebook era para velhos e isso não me convinha. Precisava dos mais novos, dos que eram futuro, dos que me ofereceriam a possibilidade de ser futuro.
3.
Durante vários anos não liguei.
E continuo a não ligar, acho a insistência profundamente ridícula.
Já escrevo no Instagram, é verdade.
Embora me mantenha no Facebook.
Os mesmos que me falavam do Instagram insistem agora para que vá para outro lado qualquer onde estão os que ditam as regras ou a malta que consome cultura está a migrar ou o raio que os parta.
4.
Implicitamente, sem darem por isso, lá está o culto da juventude.
Ou o culto da marginalização dos mais velhos.
Como se os mais velhos não contassem para o totobola, como se fossem menos dignos ou incapazes de estar no lado que interessa.
Tenho quase 200 mil seguidores no Facebook, mas há quem me diga que bom era se os tivesse no Instagram.
Encho quase todos os espetáculos que faço nos mais variados lugares, mas há quem me diga que bom era se aqueles milhares fossem em média dez anos mais novos.
Vendo muitos milhares de livros e as minhas sessões de autógrafos estão cheias, mas há quem me diga que bom era se os livros fossem dirigidos a um público mais jovem.
Os postais do dia são populares, mas há quem me diga que bom era se fossem um pouco menos populares, um pouco mais elitistas.
Não preciso de dar entrevistas nos órgãos de comunicação tradicionais para que as pessoas saibam o que estou a fazer, mas há quem me diga que bom era se as desse para que o meu nome não pertencesse apenas a um nicho.
Digo-lhes que os 200 mil seguidores que me leem todos os dias são em maior número do que 90 por cento dos jornais em Portugal, mas há quem me diga que bom era se esses tantos que leem fossem outros, os que leem coisas a sério.
Digo-lhes que os livros que os mais velhos compram valem o mesmo que se fossem comprados por adolescentes, mas há quem me diga que bom era se eles fossem eternos – não o sendo, tendo uma esperança de vida menor, só me resta gozar da fama nos anos em que ainda aqui estão. Depois, a mama acaba.
5.
Era isto.
Para estes teóricos de merda, envelhecer é um embuste, um inferno, uma morte antes da morte.
Temos nas suas cabecinhas pensadoras de fugir, enquanto é tempo, dos velhos como o diabo foge da cruz.
Pela minha parte, estarei aqui.
Escrevo para todos.
Velhos e novos.
Mas estar ao lado dos que envelhecem.
Ter a sua confiança.
As suas palavras.
E a sua presença…
… é das coisas mais sublimes que alguém pode conquistar.
Orgulho-me muito disso.
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