1.
Chama-se Alberto Carvalho o português que mais admiro entre todos os portugueses que considero admiráveis.
Quase ninguém o conhece aqui, mas o seu nome tem dividido as águas nos Estados Unidos – de um lado, tornou-se bandeira dos que consideram Trump um símbolo do mal; do outro, tornou-se um alvo para os que juram estar com Trump até à morte.
2.
Em Portugal, poucos são os que o conhecem.
Só alguns amigos da sua juventude ainda se lembram de que morava numa casa miserável sem casa de banho, luz e água potável. No Bairro Alto dos marinheiros e fadistas, da gatunagem e dos jornalistas, das prostitutas e escritores, Alberto e os seus cinco irmãos faziam o que podiam para ajudar o pai e a mãe que costurava sem parar.
Foi o único a pedir ao pai para prosseguir os estudos, não queria desistir, tinha sonhos.
E assim foi: terminou o liceu em 1982 e tornou-se o orgulho da família.
3.
Tinha 17 anos, mas o liceu não lhe bastava.
Juntara dinheiro em segredo e poucas semanas após o último exame já estava na América.
Ao desembarcar em Nova Iorque, com um visto para três meses e o deslumbre da Estátua da Liberdade, atacou o seu primeiro problema. Precisava de arranjar trabalho, fazer o que fosse preciso pois nem sequer tinha dinheiro para jantar nesse primeiro dia.
Quatro horas depois de ter chegado já estava a lavar pratos. Esteve na cozinha de um restaurante de vão de escada, mas arranjou um emprego infindavelmente melhor: acartar sacas de cimento e tijolos em obras.
Entretanto o visto caducou e Alberto ainda era menor.
Passou a dormir na rua, a dormir literalmente debaixo da ponte.
Foi sem-abrigo durante dois meses. E um dia, coisas de um destino que não se cansa de nos surpreender, um professor deu-lhe uma moeda e ficou um bocadinho à conversa.
4.
Alberto maravilhou-o com os seus sonhos.
O professor americano ajudou-o a legalizar-se e o miúdo português voltou a estudar. Ao fim de um ano já recebia bolsas de mérito e licenciou-se com brilhantismo em Biologia. Tornou-se professor de Física num liceu em Miami.
A sua capacidade de fazer coisas encantou toda a gente e rapidamente o convidaram para vice-diretor da escola.
Imaginou projetos, escreveu livros sobre educação e somou diplomas e honrarias – durante mais de dez anos revolucionou o ensino na Florida e enquanto superintendente, com a tutela de 400 mil alunos, tornou-se icónico.
Durante a pandemia, muito influenciado pela família Obama, aceitou o convite para liderar todas as escolas de LA, o segundo maior distrito escolar americano, com a tutela de 660 mil alunos e de largas centenas de escolas.
5.
Alberto Carvalho é o português que mais admiro.
Tem 65 anos e está nas bocas da América. Já há entre os fanáticos quem o ameace de deportação.
E sabes porquê?
Porque a polícia quis entrar pelas suas escolas para prender e deportar miúdos para El Salvador.
Alberto pôs-se à frente e moveu mundos e fundos para que tal não acontecesse. Na escola ou em casa.
A escola não podia ser um lugar de medo, a escola era um lugar de esperança, futuro e proteção. Por isso, se quisessem entrar e levar as suas crianças teriam de o levar a ele.
Alberto é uma lição de coragem.
Nascido num bairro de fadistas, ladrões, poetas, má fama e jornais, é um dos mais brilhantes soldados do Bem.
E é português a língua que fala dentro de si.
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