Sabes quem é Carlos Gonzalez Pintado? Até hoje, eu também não sabia. Mas esta manhã, lendo o jornal La Vanguardia, fiquei a saber que este homem durante quarenta e três anos ligado à Nasa, em Espanha, foi o primeiro habitante do planeta a saber que Neil Armstrong pisou a Lua. Ele soube meio segundo antes dos maioriais da Nasa, por um motivo que o nosso entendimento pode cronometrar. Gonzalez Pintado era o responsável pelo departamento de radiofrequência da estação da Nasa de Fresnedillas de la Oliva, em Espanha cuja função era impedir qualquer corte na transmissão audio entre a Apolo 11 e Houston. O sinal áudio do contacto do módulo com o solo lunar chegou aos ouvidos de Carlos Gonzalez Pintado meio segundo antes de chegar aos cientistas do Centro Espacial.
Meio segundo é um grande compasso para a Humanidade, é um salto adiante no ponteiro que se move nuns versos que o Pessoa pôs em órbita em 1932: “O ponteiro dos segundos / é o exterior de um coração. / Conta a minutos os mundos, / que os mundos são sensação”.
Já não estamos no ponteiro dos segundos, mas no dos meios segundos. Quanto é meio segundo? Li há dias que a Mc Laren está pelo menos meio segundo à frente da Red Bulls. Fico na mesma, um pouco atordoado, talvez, mas na mesma.
Quero mais do que isso, quero o lindésimo de segundo de Paulo Leminski, em pura vertigem poética.
“Por um lindésimo de segundo”, (gritou o autor de Não Fosse Isso e era Menos / Não Fosse Tanto e era Quase) “tudo em mim anda a mil./ Tudo assim / tudo por um fio”.
Podemos adjectivar desse modo, usando lindésimo como se fosse uma milésima maneira de fragmentar ainda mais cada fragmento, de fraccionar cada fracção, de procurar o ínfimo lá onde ele se abra ao
Tratado Geral de suas grandezas. Foi isso que ocupou a sábia lentidão de Manoel de Barros, podemos sim.
Procuremos a unidade de tempo infinitesimal, pela enésima vez, procuremos. Assim os deuses o permitam. Assim nos seja dado esse vislumbre, por uma unha negra, por um cagagésimo de segundo.
Texto e programa de Fernando Alves
