1.
Está a comemorar 60 anos de carreira.
Mas fá-lo como se fosse novo, como se tivesse todo o tempo à frente, como se tivesse tomado um comprimido que impede o envelhecimento por fora e por dentro, como se estivesse mais fresco do que o estagiário que agora começa, como se a vida não lhe tivesse passado, mais as suas mazelas e vitórias.
Este postal é especial.
Por ser sobre um homem da rádio.
De uma rádio que era dominante e enchia estádios.
De uma rádio feita de proximidade, improviso e até ingenuidade.
2.
Sessenta anos passaram pela primeira vez que um microfone se abriu para a sua voz.
Não tinha bigode nem ainda fazia a barba todos os dias. Só uma vez por outra cortava a penugem por não abdicar de estar impecável.
Celebramos um homem de que não nos esquecemos.
Deixou de estar em antena todos os dias, mas é como se continuasse todos os dias a despertar-nos – mesmo aos que já não o conhecem, mesmo alguns desses são bem capazes de ter na sua informação genética fragmentos do que a sua voz fez aos pais e avós, estilhaços das canções que compôs, de uma popularidade sem populismo, de uma fronteira entre a rádio do passado e o futuro, entre o nacional-cançonetismo e a modernidade.
3.
António Sala era o homem em quem o passado ainda confiava.
Mas era também o homem que o futuro não desdenhava por ter ideias ousadas e uma vontade enorme de não desaproveitar a vida.
Manteve o bigode na moda.
Já ninguém usava, mas nele ficava bem.
Contou anedotas que os humoristas rebentaram, mas na sua boca faziam-nos rir.
Vendeu pulseiras a meio mundo por ser o português em que em todos confiávamos, se ele nos dizia que as pulseiras faziam bem as pulseiras faziam bem.
Mas se não resultava não o culpabilizávamos a ele, como poderíamos ficar chateados com o António Sala?
Com um humor nem a mais nem a menos.
Com um cuidado pelas pessoas próprio de um médico de alma.
Como ficar chateados com alguém lá de casa, alguém que entrava todos os dias mais a sua voz e o seu bigode sempre na moda?
Muitos parabéns, António.
Que os próximos 60 anos sejam ainda melhores do que estes.
Texto e programa de Luís Osório
Ouça o “Postal do Dia” na Antena 1, de segunda a sexta-feira, pelas 18h50. Disponível posteriormente em Spotify, Apple Podcasts, Google Podcasts e RTP Play.