1.
A vida pode ser mais indomesticável do que a imaginação.
Dentro da nossa cabeça podemos ser ricos quando somos pobres, podemos ser felizes quando parecemos estar condenados à tristeza, podemos amar alguém quando ao nosso lado se deita uma pessoa que não já não suportamos, mas não é sobre essa vida ou imaginação de que escrevo.
Falo de uma outra.
Da vida de todos os dias, do que nos obriga a cometer erros que pouco têm a ver com a nossa essência, de acontecimentos improváveis que nos atropelam como se tivéssemos deixado de pensar ou de ter mão em nós.
2.
Veja-se Betty Grafstein.
No que foi a sua história, nas pessoas que conheceu, nos países que visitou, no poder que conquistou com inteligência, no que teve de sofrer, resistir e voltar a ganhar.
Como é que uma mulher como esta se sujeitou a um teatro de segunda ou terceira categoria?
É como se uma cantora da Broadway acabasse a sua vida a cantar no Centro Comercial da Bobadela, sem menosprezo pelo cheiro do Trancão.
3.
Betty foi adotada em bebé e só soube disso a poucos dias de fazer 18 anos.
A família inglesa ofereceu-lhe boas possibilidades, a mãe adotiva era dama de companhia da Rainha Mary, avó da futura Rainha Isabel II.
Soube que fora adotada quando casou ainda menor.
Foi viver para Nova Iorque onde deu à luz o que viria a ser o seu único filho. E com ele nos braços foi abandonada por um marido que nunca mais voltaria a ver.
4.
Pegou no seu bebé e fez-se à vida.
Trabalhou numa fábrica de refrigerantes e por orgulho nunca pediu ajuda aos pais adotivos que a tinham desaconselhado a casar. Por um mero acaso ou destino conheceu um influente e carismático negociador de diamantes que a protegeu e lhe escancarou o mundo.
Albert tinha 49 anos e ela 21.
Betty não se limitou a viver uma vida de milionária.
Quis aprender.
Quis ajudar o marido a multiplicar o que tinha.
Começou a desenhar joias, a negociar e a diversificar negócios.
Conheceu o mundo e o poder do mundo – privou com presidentes americanos, com a Rainha de Inglaterra, com os Onassis desta vida.
E os dois apaixonaram-se por Portugal e por Sintra.
Quando Albert morreu, Betty já tinha o seu pequeno império e continuou a trabalhar e a estar uma parte do ano em Portugal.
5.
Era bonita e luminosa.
Extravagante e com um sentido de humor que desarmava.
Conheceu José Castelo Branco e casou num cartório em Loures, quase há trinta anos.
Não faço qualquer juízo de valor sobre o que se tem falado, veremos o que acontece.
Pergunto apenas da razão que levou uma mulher forte e milionária, uma mulher que conheceu e privou com gente excecional, uma mulher que com coragem assumiu as dificuldades que a vida lhe propôs…
…o que a levou a sujeitar-se à farsa decadente de um circo de subúrbio?
O que a levou a sujeitar-se a um homem como José Castelo Branco?
Texto e programa de Luís Osório
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