1.
De vez em quando vale a pena recordar coisas simples. É que no meio desta loucura quase geral em que tudo o que é discutido parece poder provocar uma guerra civil, talvez mereça a pena gritar que o patriotismo não é um exclusivo dos extremistas.
Neste Dia de Portugal, eu, Luís Miguel Matos dos Santos Osório, 52 anos de idade, cidadão moderado, assumidamente de uma esquerda democrática e avessa a radicalismos, assumo-me patriota.
Amo Portugal e a nossa língua.
E não trocaria o nosso país por nenhum outro.
2.
Gosto das nossas contradições.
Da loucura de mudarmos de opinião de um momento para o outro, de sermos românticos e cínicos, generosos e invejosos, ambiciosos e caguinchas, por acharmos que somos os maiores e os mais miseráveis, pelo Sol e pelo fado, pelo Manuel Germano e pelo género humano, pelo humor e miserabilismo.
Gosto do pastel de nata e do leitão à Bairrada.
De me sentir culpado e redimido logo a seguir.
Do cozido à portuguesa e do caldo verde, da Amália e do Cristiano Ronaldo, do meu Benfica, mas também do Sporting e do FC. Porto – como poderia viver sem eles?
3.
Gosto de teatro de revista.
De cada bocadinho do país, de cada aldeia, dos caçadores de baleias açorianos perdidos por não terem mar, das tascas onde homens se continuam a perder, da poesia dos falhados e vencidos, da minha infância tão difícil…
… do arroz à Valenciana que se comia quando o rei fazia anos, da nossa história, mesmo das nossas misérias, dos heróis e vilões, dos reis e príncipes, do João, Mestre de Avis, do sebastianismo, das freiras carmelitas que rezam por nós, dos que limpam a “cagada” que fazemos, dos que trabalham em lixeiras, das sardinhas assadas com pimentos, da Simone de Oliveira e da Casa do Artista que não deixa ninguém para trás.
Gosto das memórias da Mitra e da Sopa dos Pobres, do trabalho de médicos, assistentes sociais e enfermeiros na Santa Casa e de todas as Misericórdias, gosto dos médicos, enfermeiros, cientistas portugueses, até gosto de alguns dos nossos ricos e dos que atingem a excelência e nos orgulham.
De Rosa Mota a Pedro Cabrita Reis, de Tiago Rodrigues a Miguel Gomes, de Ricardo Araújo Pereira a António Guterres.
Gosto da literatura portuguesa, de Saramago e Lobo Antunes, de Nuno Júdice a Ary dos Santos, de Fausto e Sérgio Godinho, mas também de Marco Paulo e Tony Carreira – todos eles são Portugal na nossa glória e pequenez, na nossa ambição e desilusão.
4.
Sou de esquerda e patriota.
E hoje, Dia de Portugal, é tempo de dizer que o patriotismo não é um exclusivo da direita radical.
Somos todos portugueses.
Todos temos um passado comum e é bastante mais aquilo que nos une do que aquilo que nos separa.
Sou mais próximo de um militante do Chega do que de um democrata dinamarquês.
Por muito que me custe é a verdade.
Texto e programa de Luís Osório
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