1.
O problema de Boaventura Sousa Santos não é apenas o de assediar mulheres que, direta ou indiretamente, dependiam do seu julgamento académico ou beneplácito profissional.
O problema de Boaventura é bem mais sinistro e complexo do que esse.
Também não é o de assediar mulheres que dele dependiam sem prejuízo de, ao longo da sua vida, ter escrito centenas de textos sobre a igualdade do género ou acerca do insuportável e desajustado poder masculino.
O problema de Boaventura é maior ainda. Mais sinistro e mais complexo.
2.
A questão também não é dizer-se de esquerda e ter sido para muitos progressistas um ideólogo, uma referência acima de qualquer suspeita.
O problema não é o que há trinta anos dele se diz nos corredores da Universidade de Coimbra.
O problema não são as acusações de beijos húmidos e apalpões nas coxas e convites e olhares lascivos a alunas de doutoramento.
O problema não é ele ser tudo o que criticava nos outros.
Tudo o que o fazia vomitar.
Tudo o que o indignava.
O problema é que Boaventura Sousa Santos não tem coragem para assumir porra nenhuma. Abre a boca e parece igual aos outros abusadores, nada o distingue.
A culpa é delas.
Dos jornalistas.
Das invejas e da podridão de uma sociedade que persegue pessoas sérias.
Com um bocadinho de jeito o senhor professor Boaventura ainda será o candidato presidencial apoiado pelo Chega.
Pelo direito de os homens serem homens.
E de as mulheres voltarem a estar agradecidas quando os homens desejam que elas estejam agradecidas.
3.
Segui o seu trabalho.
Os seus apoios políticos.
As suas conferências a falar de Deus e dos Direitos Humanos, da necessidade de as esquerdas se unirem.
Li as entrevistas onde falava da evolução da democracia e da necessidade de as mulheres se emanciparem em definitivo de uma subalternidade injusta em relação aos homens.
Não gosto de bater em quem está no chão, mas não há um pingo de arrependimento ou de vergonha no homem.
Cada mulher que se queixa é mais uma que fala só para o prejudicar.
O grande professor.
O grande senhor feudal.
O grande sonso.
Texto e programa de Luís Osório
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