1.
Os especialistas de futebol são quase unânimes quando escolhem quem é o melhor jogador português da atualidade.
Uns mais entusiastas do que outros, uns mais acalorados do que outros, mas vão quase sempre dar ao mesmo nome: Bernardo Silva.
Apostaria que a maioria dos adeptos tem a mesma opinião, mas são raros os que falam do Bernardo com verdadeira paixão.
Quando chega aos estágios a malta grita sempre mais por outros.
Quando dá entrevistas televisivas cá e lá nunca tem grandes audiências.
Até para os benfiquistas não foi decisivo quando apoiou um candidato contra Rui Costa. Os benfiquistas ouviram, mas não votaram pressionados pela sua indicação de voto.
2.
Bernardo é um dos melhores do mundo, mas não há gritos histéricos à sua passagem.
Perguntaram um dia ao seu treinador, o genial Pepe Guardiola, da razão para que isso acontecesse – o catalão sorriu e respondeu que a culpa era da ausência de tatuagens por que se ele as tivesse talvez o olhassem de outra maneira.
É um assunto interessante.
O Bernardo não tem tatuagens, mas não me parece que seja apenas por isso.
Tentando encontrar uma explicação para a falta de paixão por alguém com um futebol tão apaixonante, diria que nele tudo é demasiadamente perfeito.
Não há uma única pessoa, um único colega, que se queixe do seu feitio, da sua personalidade. É simpático, trata bem toda a gente, não cria ondas, não tem inimigos.
É uma coisa boa, mas a paixão faz-se de combate, de conflito. Os bonzinhos não têm, desse ponto de vista, a vida facilitada.
3.
O Bernardo não passou contrariedades na juventude.
A sua família é de classe média alta, estudou sempre em colégios, tinha casa de férias e era um betinho de Lisboa. A sua história não dá um filme, se fosse a um programa de confidências não existiria forma de a audiência chorar com a sua vida.
Depois, o Bernardo não revela sinais de riqueza exterior. Não mostra relógios de muitos milhares de euros, casas faustosas, carros desportivos e roupas extravagantes.
Gosta de andar de Smart, de ler e de não ser notado.
Por último não se conheceram amores e paixões antes de um casamento celebrado com uma mulher muito bonita, mas demasiado discreta para os padrões das estrelas.
Bernardo tem uma filha bebé, mas não a mostra.
É tudo ao contrário do que o mercado pede. Animação em permanência e ídolos que se possam vender fora do campo.
Bernardo, não.
É diferente.
E também por isso é o meu preferido.
Texto e programa de Luís Osório
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