A edição do programa “Duas ou Três Coisas” do dia 1 de março aborda as muitas variações da ficção científica cinematográfica tendo como ponto de partida a literatura. O momento é especialmente motivador, uma vez que os ecrãs de todo o mundo acolheram, esta semana, a muito aguardada Parte 2 de “Dune”, de Denis Villeneuve. Ainda e sempre sob a inspiração do romance de Frank Herbert publicado em 1965, Villeneuve prolonga, assim, o seu “Dune” (2021) naquele que é, afinal, um raro desafio de concepção narrativa e gigantismo de produção.
Continuamos a seguir a epopeia de Paul Atreides — personagem que permite a Timothée Chalamet confirmar o seu halo de grande estrela internacional —, apostado em consumar a sua aliança com os Fremen, o povo do planeta deserto Arrakis, para enfrentar o clã Harkonnen. O próprio Villeneuve reconheceu que, como é natural, uma segunda parte, não necessitando de uma apresentação tão elaborada das personagens principais, lhe permitiu investir muito mais no dramatismo das sequências mais dialogadas ou na dimensão espectacular das batalhas. Além de que, com intérpretes regressados, a par de algumas novidades do elenco, este é um filme servido por uma galeria de luxo em que encontramos nomes como Rebecca Ferguson, Josh Brolin, Stellan Skarsgard, Dave Bautista, Zendaya, Charlotte Rampling e Javier Bardem, ao lado de Austin Butler (o “Elvis” de Baz Luhrmann), Florence Pugh, Christopher Walken e Léa Seydoux…
Para a indústria cinematográfica de Hollywood, o impacto do primeiro “Dune” envolveu a consolidação de uma componente estratégica que estava (e está) longe de ser secundária. De facto, uma certa rotina instalada na produção de aventuras de super-heróis com chancela Marvel ou DC Comics (incluindo vários falhanços de bilheteira) aconselhava alguma derivação nos filmes pensados e e fabricados para os grandes ecrãs — com inevitável e justificado destaque para os recursos específicos, visuais e sonoros, das salas IMAX.
Ora, não se confundindo com as componentes dos filmes de super-heróis, o novo “Dune” apresenta-se também como um projecto apostado em explorar as mais variadas e sugestivas referências, e não apenas literárias — veja-se o video, aqui em baixo, em que Villeneuve explica a sua recriação da escrita de Frank Herbert e também as várias memórias cinéfilas que o influenciaram.
Com “Dune – Parte 2”, Villeneuve consolida, assim, o seu lugar numa galeria de de cineastas que, ao longo das últimas décadas, têm transfigurado os domínios da ficção científica e, em termos globais, das “grandes aventuras” (expressão que adquiriu identidade própria no panorama industrial e comercial do cinema desde o impacto de Indiana Jones no começo da década de 1980). Além do mais, convém não esquecer que foi também ele que deu vida a “Blade Runner 2049” (2017), sequela do clássico “Blade Runner” (1982), de Ridley Scott.
Curiosamente, os primeiros filmes de Villeneuve pareciam encaminhá-lo para diferentes domínios dramáticos — lembremos o policial “Raptadas” (2013) e esse invulgar “thriller” intimista que é “O Homem Duplicado” (2013), baseado na obra de José Saramago. Seja como for, entre os projectos que Villeneuve tem em marcha está o encerramento de uma trilogia. A saber: “Dune – Parte 3”.