“Pobres Criaturas” venceu o Leão de Ouro no Festival de Veneza, e é um dos filmes em destaque na próxima edição dos Óscares da Academia norte-americana de Artes e Ciências Cinematográficas com um total de 11 nomeações, incluindo melhor filme, realizador e atriz principal.
Inspirado no livro do escocês Alasdair Gray, escrito na década de 90 do século passado, “Pobres Criaturas” é uma novela gótica, mas Yorgos Lanthimos encontrou na obra a possibilidade de abordar temas atuais.
Falar de liberdade, do que pensamos e de como olhamos para o mundo. Da posição da mulher na sociedade, e também dos homens e das relações entre homens e mulheres. Acho que isso é muito atual (…) O livro foi escrito nos anos 90 e é engraçado que não mudou assim tanta coisa desde então.
Emma Stone, que integrou o elenco de “A Favorita”, volta ao cinema de Yorgos Lanthimos e garante mais uma presença nos Óscares, nomeada enquanto atriz principal, mas também como produtora do filme. A personagem que desempenha é Bella Baxter. Uma jovem submetida a uma experiência científica radical, que se comporta como uma criança, no corpo de uma adulta.
Ingénua e curiosa, Bella não tem qualquer tipo de filtro social, ou emocional, surpreendendo o mundo machista que a rodeia, no qual os homens tentam controlar todos os segmentos da vida de uma mulher.
Yorgos Lanthimos admite que se sentiu atraído pela perspetiva desta personagem, que não se parece com nenhuma outra que já tenha lido, sublinhando que é “uma mente livre, que não tem vergonha ou preconceito e quer experimentar o mundo à sua maneira.”
Lisboa, pastéis de nata e Carminho
Bella Baxter resulta do trabalho do brilhante cientista Godwin Baxter, interpretado por Willem Dafoe, que tenta educar a jovem mantendo-a longe dos olhares curiosos do mundo.
Quando Bella conhece um advogado ousado e provocador interpretado por Mark Ruffalo, os tempos de reclusão acabam, e os dois deixam a Londres vitoriana para uma viagem que começa em Lisboa. Uma cidade futurista, recriada em estúdio, marcada, ao mesmo tempo, por uma forte cultura popular.
Bella fica rendida aos pastéis de nata e à voz de Carminho, no tema “O Quarto”, que interpreta à guitarra numa ruela da cidade e que está incluído na banda sonora da autoria de Jerskin Fendrix que está nomeada para os Óscares.
Lisboa, Londres, ou Paris, são destinos da viagem da protagonista, filmados em estúdios construídos em Budapeste. O diretor de fotografia Bobbie Ryan, que também trabalhou com Yorgos Lanthimos em “A Favorita”, admitiu em conversa com o Cinemax que Lisboa foi desafiante, tendo em conta que era necessário iluminar um estúdio muito grande, para ter o sol brilhante que é uma das imagens de marca da capital portuguesa.
A composição visual do filme explora o mundo de descoberta, alternando entre o preto e branco e as cores, criando um tempo e um espaço muito próprios, para nos revelar o mundo que Bella está a descobrir.
Para Yorgos Lanthimos “não podia ser o mundo como o conhecemos, tinha de ser moldado e esculpido através do olhar dela (…) com vários elementos que não são realistas.”
As personagens existem num tempo suspenso, num filme que também fala do nosso tempo. “Pobres Criaturas” é uma crítica à sociedade que estabelece regras de comportamento para homens e mulheres.
Uma nova leitura do clássico Frankenstein, feita com humor e provocação através de uma fotografia e de uma direção de arte surpreendentes, que também fazem parte da lista de 11 nomeações aos Óscares. Um filme sensação que não tem definição fácil, algo pouco comum no atual panorama de produção de cinema.