1.
Encontrei-me com Graça Freitas para celebrarmos uma amizade improvável.
Combinámos almoçar no Old House, conhecido restaurante chinês no Parque das Nações. A Ex, mas para sempre, Diretora Geral de Saúde, mora para aqueles lados e viveu vários anos em Macau, pareceu-nos o lugar perfeito.
2.
O encontro prolongou-se por mais de duas horas.
Graça riu-se muito quando pedi crepes como faço nos outros restaurantes chineses…
… não havia crepes e eu comecei a desconfiar.
Depois, ao vê-la comer arroz com pauzinhos tentei não dar imagem de fraco e mergulhei na aventura. Juntei os bagos nos pauzinhos, mas sempre que os levava à boca o minúsculo arroz que juntava com esforço, tombava outra vez no prato.
Uma barraca.
3.
Pedi faca e garfo e lá descontraí.
Graça Freitas está bem.
Para te ser sincero, parece outra – mais tranquila, mais luminosa, mais jovem.
Incrível o que passámos na pandemia.
Incrível tudo parecer já tão distante, como se tivesse sido numa outra vida, numa outra reencarnação.
Falámos disso ao almoço.
Das conferências de imprensa, do medo que quase todos sentimos, ela também, o medo de não estar à altura, o medo pela velha mãe poder morrer sem ar, o medo de o cancro que tinha se alastrar e impedir que fosse até ao fim na sua missão de vida.
O medo de não voltar a comer arroz com pauzinhos descontraidamente e sem agenda.
O medo de nunca mais poder tratar das suas flores.
4.
Trago-te hoje um almoço em que me senti grato por ter à minha frente uma mulher excecional.
Uma mulher que fez o que tinha a fazer.
Que o fez pelo país e por mim.
E por ti e pela tua família.
Um almoço em que fui portador de um abraço que é o de tantos que também lhe são gratos.
Teremos de repetir, mas desta vez num lugar em que não passe a vergonha de perguntar pelo crepe ou de pedir faca e garfo para comer o chau-chau.