1.
José fracassou no dia em que o menino nasceu
Tinham-lhe rebentado as águas e Maria já não aguentava mais.
Estava demasiadamente macerada do caminho…
…de Nazaré para Belém, em cima de um burro pobre, como todos os seus pertences, não deve ter sido fácil aguentar.
José fracassou por não ter conseguido encontrar um lugar em condições, seguro e abrigado.
2.
Descobriu uma gruta ou um estábulo com palha e animais, um sítio que estava escrito antes de ser encontrado.
Nasceu o bebé e José sossegou-o num comedouro de vacas e porcos e o milagre começou – conheces a história, sabes dos pastores, da estrela, dos magos e de toda a liturgia.
3.
Sabes, mas esqueces… como eu, de José.
A minha personagem preferida.
Um pai que não era pai.
Um pai que aceitou como verdade o milagre que a sua mulher jurava estar a acontecer, o milagre de estar grávida sem que José pudesse ser o pai.
Consigo imaginar-lhes as dúvidas, os medos… ou os meus medos e dúvidas se tal me acontecesse.
Claro que lhe aparecem anjos em sonhos, mensageiros que lhe dizem o que fazer, esperar, temer. Mas José acreditou e soube aceitar o seu grandioso destino.
4.
Era carpinteiro de uma linhagem direta de David.
Não lhe faltava trabalho, aceitava encomendas até dos romanos, cruzes para condenados.
José desaparece depois de todos os livros ainda Jesus não era um homem.
Já não o vemos em Jerusalém, quando o filho de Maria, com 12 anos, é encontrado no templo.
Já não o vemos quando Jesus escolhe os apóstolos.
Ou nos milagres.
Ou na Via-Sacra.
É sempre Maria quem está.
José não.
José evapora-se sem mais nenhuma referência em qualquer Evangelho.
Terá morrido, mas não há informação, uma única.
5.
Hoje, dia em que Jesus nasceu.
Hoje, dia em que José protegeu um bebé que sabia não ser seu e a quem ensinou carpintaria e a linguagem dos anjos e dos sonhos.
Hoje, dia de Natal num tempo em que parecemos todos tão zangados. Em que tudo é posse, poder, arrogância, certezas, dinheiro e sucesso, celebremos José, o pai que não era pai, mas que soube ser grandioso.
O meu personagem preferido, o mais humilde e despojado dos homens, o que desapareceu sem ruído, como se nunca tivesse existido.
Um bom e feliz Natal.
Até amanhã.
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