1.
Rui Patrício despediu-se do futebol.
A Federação Portuguesa fez-lhe uma bonita homenagem, mas a generalidade da Comunicação Social ofereceu ao acontecimento uma envergonhada importância, um rodapé do dia.
Rui é o guarda-redes mais internacional da história do futebol em Portugal – vestiu a camisola da seleção 108 vezes.
Foi o herói da conquista do Campeonato da Europa.
É certo que sem aquele pontapé divino de Éder não teríamos conseguido, mas também é certo que sem as suas defesas impossíveis nem sequer teríamos chegado à final e muito menos a teríamos ganho.
2.
Foi também o guarda-redes com mais jogos na história do Sporting, mas caiu em desgraça por ter virado as costas após o ataque de vândalos a Alcochete.
Talvez a Rui Patrício tenha faltado jogar num grande clube internacional, mas a sua carreira é extraordinária.
Só que ele, sendo um dos maiores, despediu-se do futebol como se tivesse tido uma carreira boa, mas banal, uma carreira parecida a de outros.
3.
Porquê?
Uma pergunta fácil de responder.
Rui Patrício é demasiado discreto.
Para um mundo viciado em sal, é insonso.
Para um país viciado em açúcar, é uma sobremesa macrobiótica.
Nunca se põe em bicos de pés, deixa sempre serem os outros a brilhar.
Raramente dá entrevistas, mas nunca procurou nas poucas que deu seguir uma estratégia pessoal.
4.
Não aparece em grandes carrões, se calhar aparece, mas não damos por isso.
Não é fotografado em grandes casas de milhões, sei que vivia num apartamento de classe média em Telheiras.
É casado com Vera Ribeiro, conhecida psicóloga, mas nem por um segundo aproveitou a relação com a mãe dos seus ainda pequenos filhos, Pedro e Eva, para tirar benefícios mediáticos.
5.
Faz pensar, não faz?
O que teria sido a carreira de Rui Patrício se fosse o contrário daquilo que é?
Se falasse, aproveitasse ou se pusesse os seus interesses à frente?
O que seria se falasse alto das suas façanhas?
O que teria sido se fosse menos humilde?
Teria sido muitíssimo mais.
Muito mais do que os tantos que se vangloriam tendo carreiras bem menos expressivas.
Carreiras que não se comparam, mas que são vendidas como se fossem pãezinhos quente.
Um dia a história colocará tudo na sua exata proporção, valha-nos isso.
Mas que irrita, irrita.
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