1.
Os anos trouxeram-me uma solidão mais funda.
Estou com pessoas e gosto de gostar, da ideia de gostar.
Preocupo-me, mas não tenho absoluta certeza se a minha preocupação é literária ou se é real.
Quando me abraçam, gosto.
Mas quero sair do abraço e voltar a um lugar de conforto, aos meus livros, às minhas coisas, a uma ideia de família, à proximidade do Natal onde torno a pensar na árvore perfeita, nos presentes, até no bacalhau penso, se é lagareiro com um azeite guloso, se é à antiga com cozido com batatas.
2.
Mas sabes…
… vou sempre a jogo.
Com os livros e projetos que tenho na cabeça, mais os livros e os projetos que as pessoas que me pagam acreditam que terão sucesso.
Deixo-me ir.
Talvez precise dos aplausos, do ser gostado, apaparicado, venerado, todas as tretas que critico nos outros.
Às vezes sou extremamente irritante.
Noutra acerto.
Sou muito completo.
Compreendo, penso e escrevo sobre áreas diferentes – da política ao futebol, da economia ao cinema, do jornalismo à literatura, da banca às lideranças, da filosofia à educação, das religiões ao teatro, do amor à morte, da sanidade à loucura.
Estou em muitos lado, não estou em lado nenhum.
Vou recusando ir a sítios por falta de energia, penso em desistir de aparecer – ficar assim, só contigo que me lês todos os dias ou de vez em quando.
Ainda assim aceito ir.
Às vezes vou e desisto, desmarco.
Invento desculpas.
Noutras apareço e depois gosto de estar, adoro os sorrisos que me tocam, sorrio de volta.
3.
Não te assustes.
Esta conversa só existe pela relação que temos.
Diária.
A comunicação é sempre a dois, uma espécie de dança, de tango ou de conversa íntima.
Entre mim, que escrevo.
E entre ti, que me lês ou que me ouves.
Acredito que, por vezes, te escuto – mesmo não te ouvindo.
Estou melancólico, eu sei.
Não te preocupes, faz parte.
A melancolia é coisa de privilegiados – e eu sou um privilegiado.
Se não o fosse, e se estivesse em baixo, eram outras palavras. Uma depressão, um esgotamento, um cansaço permanente.
Estou bem, apenas melancólico e pensativo.
A Eugénia, onde compro os jornais, diz-me várias vezes:
“Luís, está muito pensativo. Tem de descontrair”.
E eu respondo-lhe que não, que estar pensativo é bom, que pensar é importante, que a única coisa má que pode ter é isto…
… isto de que te falo hoje.
Uma melancolia com o que vamos construindo, com os desvios que fazemos, com as nossas contradições.
É mesmo assim, estamos juntos nesta nau Catrineta.
E sabes que regresso na segunda-feira.
Não te falho.
Não me falhes também.
Aparece no lugar do costume.
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