1.
Passaram 80 anos pelo desembarque na Normandia, a maior invasão marítima da história – não houve paralelo antes e não se repetiu depois.
Ficou como o Dia D, o dia em que 160 mil soldados, quase todos americanos, atravessaram o Canal da Mancha.
Dez mil perderam-se no primeiro dia.
E nessas primeiras 24 horas nenhum dos objetivos foi alcançado pelos aliados. Mas aquele desembarque marcaria o fim da segunda guerra mundial, mesmo que tenha acontecido quase um ano antes da rendição dos nazis, dos fascistas italianos e do Japão.
2.
Há precisamente 80 anos e 13 dias, desembarcaram na Normandia milhares de soldados, alguns que sabiam ser carne para canhão, mártires da liberdade.
Mas hoje, precisamente hoje, faz 80 anos que as fotografias do genial Robert Capa foram publicadas na revista Life.
Onze imagens do desembarque, onze provas de que a guerra estava a mudar e a pender para os aliados.
Robert Capa já era uma celebridade. Aos 18 anos fotografara um Trotsky mais cansado e mais vencido do que se imaginava e logo depois, com pouco mais de vinte, ofereceu ao mundo imagens imortais da guerra civil espanhola.
3.
Naquele Dia D, dois ou três anos antes da fundação da agência Magnum com Cartier-Bresson, o judeu Robert Capa fazia chegar à redação da Life as fotografias que o mundo precisava de ver.
Foi o único fotógrafo presente, o único a testemunhar.
O mundo viu as provas 13 dias após o acontecimento.
Venderam-se milhões de revistas, o jornalismo foi celebrado e eu penso alto: será que o culto do direto tornou a informação mais perfeita ou tornou mais difícil a tarefa de mediação?
Não quero ou posso ser pueril.
O progresso não será travado, é este o nosso tempo e não o de Capa e Bresson, mas aqueles 13 dias em que o mundo nada viu foram penosos ou permitiram um distanciamento que deixou de ser possível?
4.
Robert Capa morreu aos 41 anos.
Pouco mais de uma década depois da Normandia.
Rebentou numa mina terrestre na Guerra da Indochina. Os seus restos foram encontrados e o corpo dividido em várias partes, mas nas mãos tinha presa a sua máquina fotográfica.
O jornalismo só é possível com pessoas capazes de um despojamento. Gente que arrisca a vida para contar uma história, sem eles morrerá a essência da mais bela profissão do mundo.
Hoje, 80 anos depois da Life ter publicado onze fotografias de Robert Capa, acreditemos no jornalismo e nos que ainda resistem.
Texto e programa de Luís Osório
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