1.
É já daqui a bocadinho.
As equipas titulares estão quase a ser anunciadas e o país estará unido para sofrer. Será difícil para nós, mas também para a França. Veremos o que acontece, mas deixemos as coisas boas entrarem pela nossa porta.
Afastemos a necessidade de ser do contra, de estar sempre à “babuja” do que está mal, do que poderia estar melhor, de acharmos que nós é que sabemos.
É irritante e doentio.
2.
Falta pouco mais de uma hora para o Portugal-França.
E hoje nos hospitais há quem vá ver o jogo sabendo que tem uns dias de vida.
Há enfermarias em que os doentes terão hoje mais morfina para poderem ver o jogo sem dores, como se fossem normais e tivessem a vida à frente.
Nos hospitais psiquiátricos do país os doentes não falam de outra coisa. Querem saber se o Cristiano marca e se podemos voltar a ser grandes. Estão tão inquietos como as nossas crianças.
É verdade o que te digo. Hoje nos autocarros cheios da madrugada, com mulheres a caminho de mais um dia em que limpam as nossas casas e as nossas empresas, e com homens preparados para trabalhar nas obras, não se discutia outra coisa.
Ou nos pisos inferiores dos hospitais centrais das grandes cidades, onde trabalham pessoas que fazem o trabalho mais duro, o que ninguém quer, os que limpam as morgues, os que caminham de esfregona nas sombras…
Também aí não se falou de outra coisa.
Ou nas prisões com criminosos e gente de má rês misturada com pessoas apanhadas pela vida.
Ou na comunidade dos sem-abrigo, dos que vivem a céu aberto. Também eles procurarão uma televisão na montra de um supermercado.
Ou os dependentes de droga que têm tanta pena de não poderem estar limpos para gritarem connosco por Portugal sem que a cabeça esteja obstruída pela necessidade da próxima dose.
Até entre as freiras carmelitas ou em ordens contemplativas se deseja saber se Portugal vai ganhar ou quem é o Diogo Costa. Haverá certamente em segredo padres e freiras a rezar pelo destino pátrio.
3.
Falta pouco mais de uma hora.
Já há onze inicial, se não há está por minutos.
Mas mais importante do que isso é que somos um. Na tua casa e na minha, aqui no estúdio da Antena 1 ou em Hamburgo, nos lugares mais esquecidos e habitados pelos vencidos da vida, por uma noite, por esta noite, estamos todos no mesmo barco.
Como não agradecer isso?
Texto e programa de Luís Osório
Ouça o “Postal do Dia” na Antena 1, de segunda a sexta-feira, pelas 18h50. Disponível posteriormente em Spotify, Apple Podcasts, Google Podcasts e RTP Play.