1.
Lembras-te da inacreditável história da mulher que teve a sua bebé no meio de uma rua do Carregado?
Faz agora um mês que tudo aconteceu.
A mãe Soraia telefonou para todas as linhas possíveis e nenhuma resposta lhe foi dada apesar de passarem já cinco dias pelas 40 semanas e de as águas lhe terem invadido as pernas.
Sem saber para onde ir e com contrações dolorosas, deixou-se cair numa rua da vila.
Os pais estavam com ela quando a mãe gritou que a bebé estava a sair – estava mesmo a sair com a sua cabecinha envolta pelo cordão umbilical. O pai de Soraia, avô da bebé, teve a presença de espírito para resolver o problema e ajudar a neta a respirar.
O seu corpo já estava roxo com o garrote do cordão, mas respirou.
2.
Um pai que retirou a neta do corpo da sua filha.
Que lhe pediu para respirar em compasso.
Para fazer força, toda a força que pudesse, para acreditar nele, para acreditar que não podia estar melhor acompanhada.
Faz por estas horas um mês que tudo aconteceu.
A bebé tem já mais de quatro quilos e chama-se Serena.
Foi por isso que escrevi o postal.
A bebé chama-se Serena… tão bonito que se tenham lembrado de um nome que é também uma palavra, quase um poema.
Serena.
Bebé resgatada pelo avô no meio de uma rua cheia de gente no Carregado.
Bebé com a vida à frente e que…
… quase apostaria…
será chamada a grandes desafios, só pode.
Filha de Soraia, 28 anos, grávida de risco.
Soraia quis ter Serena, apesar de alguns a desaconselharem.
Já tinha dois filhos, não tinha um rim, era arriscado.
O que não lhe disseram era que, ainda por cima, o parto seria feito pelo pai no meio da rua.
3.
A Serena está em casa, nos arredores de Alenquer.
Gosta de estar ao colo do avô, parece sossegar com a sua voz.
Faz por estas horas um mês e estreará um vestidinho de verão. É provável que passe pela rua onde nasceu e espero que a mãe Soraia receba um telefonema da ministra da Saúde.
Cara ministra, não precisa de me agradecer ou de publicitar, mas faça isso.
Diga à Soraia que a bebé Serena é especial.
Não resolverá nada de essencial, mas as palavras têm o seu valor.
Vá por mim.
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