1.
O Boris gostava de passear pela terra de Baguim do Monte.
E adorava a dona que foi expulsa de casa pelos sogros por causa dele – os velhotes não gostavam nada de cães e ameaçaram fechar-lhe a porta para sempre se não se livrasse do maldito Boris.
A senhora ficou desesperada.
O cão era muito para ela, acompanhava-a nas lágrimas, ouvia-lhe os prantos e desabafos, levava-a à rua e esperava por ela nas refeições antes de engolir a sua ração.
A senhora pensou que não tinha outro remédio se não sair daquela casa, mas foi até à Junta de Freguesia e perguntou se havia solução para o seu triste problema.
2.
O presidente de Baguim do Monte, Francisco Laranjeira, lugar do concelho de Gondomar, comoveu-se com a história e tentou encontrar uma solução.
Durante uns dias o Boris podia ficar na Junta.
Certamente que se encontraria alguém para ficar com o bicho.
A Junta colocou uma mensagem no seu site, fizeram-se telefonemas, escreveram-se emails, os dias foram passando e nada.
O Boris dormia numa caminha de cão numa das divisões da Junta e as pessoas revezaram-se para o levar à rua.
3.
Foi então que aconteceu um milagre canino.
O Boris começou a aproximar-se das pessoas.
Quando estavam tristes aproximava-se mais, como se pressentisse estados de espirito e maleitas de alma.
Quando estavam contentes e brincavam, abanava a cauda e parecia que ria.
Quando alguém chegava à Junta o Boris sinalizava.
E fazia “conversa”, como se fosse um mestre de cerimónias ou relações públicas.
4.
Ao fim de uma ou duas semanas o presidente perguntou do cão.
E toda a gente falou ao mesmo tempo…
– Que o Boris era útil.
– Que não se importavam de o levar à rua.
– Que o ambiente estava melhor.
– Que os fregueses adoravam aquela presença.
Francisco Laranjeira teve então uma ideia luminosa – ou aceitou a ideia luminosa de alguém, não sei em concreto.
Sei que decretou que o Boris devia assinar um “contrato” por tempo indeterminado com a Junta de Freguesia.
Uma prestação de serviços como guarda das instalações.
Na assinatura estiveram presentes as forças vivas de Rio Tinto, como também é conhecida a freguesia.
E Boris leva a coisa a sério.
Não há movimento que ele não sinalize.
Não há pessoa que ele não goste.
Em rigor, desconheço se passa recibo verde, mas parece outro.
Ele e a dona que talvez tenha voltado para casa dos sogros. Feliz por ter proporcionado ao seu cão uma vida de sonho que ela muito dificilmente terá.
Texto e programa de Luís Osório
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