Com a estreia de “Conclave”, baseado num best-seller de Robert Harris, o cinema volta a interessar-se pelo que acontece nos corredores do Vaticano — os seus rituais e o seus segredos, eventualmente as estratégias de poder que se jogam no interior de uma complexa hierarquia.
Realizado pelo alemão Edward Berger (recorde-se que o seu “A Oeste Nada de Novo” ganhou o Óscar de melhor filme internacional referente a 2022), “Conclave” reflete muitos temas do presente mas é, para todos os efeitos, uma obra de ficção. Com uma premissa comum a vários títulos que já abordaram o funcionamento das estruturas do Vaticano: há um Papa que morre e torna-se necessário reunir os cardeais de todo o mundo (o Conclave, precisamente) para escolher o novo Bispo de Roma, isto é, o líder da Igreja Católica.
Um dos casos mais célebres do mesmo tipo de premissa, inesquecível para os espetadores que começaram a descobrir o cinema na década de 60 do século passado, é “As Sandálias do Pescador” (1968), de Michael Anderson, com Anthony Quinn no papel de um bispo russo que foi prisioneiro político na Sibéria. Neste caso, o drama vivido pelo protagonista é indissociável dos tempos da Guerra Fria — trata-se também de uma produção que adapta um livro de sucesso, da autoria de Morris West.
Ainda assim, o novo filme possui uma dimensão cénica e cenográfica que lhe confere um dramatismo muito especial. Há, de facto, em “Conclave” uma sensação de fecho do espaço, com o seu quê de claustrofóbico, que resulta do rigor com que Berger encena uma vivência realmente interior, já que o sistema de votações para um novo Papa implica um corte total com o resto do mundo.
O cinema debruça-se, assim, sobre um universo cujo fascínio não é estranho a um clima de mistério e “suspense”. Lembremos também o exemplo mais remoto de “A Agonia e o Êxtase” (1965), de Carol Reed, centrado no diálogo, e também nas tensões, entre Miguel Ângelo (Charlton Heston) e o Papa Júlio II (Rex Harrison) durante a pintura do tecto da Capela Sistina. Ou ainda o recente “Dois Papas” (2019), de Fernando Meirelles, colocando frente a frente Bento XVI e o futuro Papa Francisco, interpretados, respetivamente, por Anthony Hopkins e Jonathan Pryce. Sem esquecer, claro, a variação em tom de comédia, pontuada por muitos detalhes dramáticos, que é “Habemus Papam – Temos Papa”, com o realizador Nanni Moretti a assumir a personagem do psicanalista do Papa recentemente eleito, interpretado pelo magnífico Michel Piccoli.
Aliás, vale a pena sublinhar que o impacto de todos estes títulos não pode ser desligado das qualidades dos respectivos intérpretes. Em “Conclave”, reencontramos o talentoso e versátil Ralph Fiennes no papel do Cardeal Lawrence, responsável pela organização e bom funcionamento do Conclave. Dizem os analistas de Hollywood que, no mínimo, Fiennes será nomeado para o Óscar de melhor actor — se isso acontecer, será a sua terceira nomeação, depois de “A Lista de Schindler” (1993) e “O Paciente Inglês” (1996).