1.
Quando era muito pequeno, mas suficientemente grande para me lembrar, conheci a história das Efeméridas.
Pensei nelas bastante tempo, o suficiente para não me ter esquecido
As Efeméridas são mais do que insetos.
Elas foram Ninfas, tiveram uma vida para cumprirem o essencial da sua existência, o momento em que saem do charco ou do rio já com pernas, asas, uma boca incapaz de comer, umas antenas e uns olhos enormes, maiores ainda nos machos do que nas fêmeas.
2.
As Efeméridas não têm tempo para ser vaidosas.
Quando o seu corpo se transforma, quando deixam de ser Ninfas e passam a poder voar, o seu tempo é curto, precisam de fazer o que têm de fazer sem hesitações, sem outra vontade que não seja a de encontrar a parceira ou o parceiro para que aconteça o namoro.
É sempre um milagre.
Porque há milhões de Efeméridas que saem ao mesmo tempo da água, absolutamente sincronizadas num movimento a que os cientistas chamam revoada nupcial.
Abandonam a água milhões de Ninfas que já não o são transformadas em poderosas máquinas de conquista.
Cada uma delas, machos e fêmeas, sabem no seu íntimo sem íntimo que, no máximo, lhes resta 24 horas.
A maioria durará menos do que isso.
Têm uma boca que parece cozida à mão por uma bruxa dos mares, não poderão comer, apenas reproduzir-se para que a sua espécie sobreviva a partir do seu sacrifício.
3.
Batizaram-nas de Efeméridas por serem efémeras que no grego significa “apenas um dia”.
Os machos voam em enxame, as fêmeas procuram-nos e o destino junta-os, macho e fêmea que se “escondem” num lugar discreto para o fazer.
Os ovos ficam imediatamente disponíveis depois do breve namoro.
Ela sai dele e voa um voo rasante sobre as águas, o seu derradeiro voo.
Faz cair, como se fossem bombas, os ovos acabados de nascer na sua barriga que não é uma barriga
Eles e elas morrem pouco depois, umas horas ou uns minutos.
Como morrem umas horas ou minutos depois, as Efeméridas que não conseguiram encontrar o seu par.
Morrem a vaguear por caminhos que não conhecem.
Sem paz, sem sentido, sem uma segunda hipótese.
Tombam quando o voo termina por falta de forças.
4.
Esta é uma história bonita e trágica.
Sempre pensei ser o preço a pagar por quem vive uma vida de ninfas… belas, mas aprisionadas no fundo das águas.
O preço de ficarem cegas pela liberdade e pelo voo que finalmente lhes é possível.
O seu último voo.
O seu único voo.
A sua única liberdade possível.
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