1.
O Ladrão morreu há dois anos, mas continua a ser fortemente lembrado nas ruas de Almada.
Não há muitos como ele.
Sem-abrigo, mancando das patas e alimentado pela população, não havia quem não o conhecesse.
2.
Passou de tudo o Ladrão.
Maus-tratos, fome, sede.
Mas o seu carinho e atenção, a sua presença sempre agradável, o seu quase sorriso para as crianças que passavam e para os velhotes no seu caminho das compras…
…o Ladrão era único.
Muitos o tentaram ajudar, mas ele gostava da rua, de andar à solta, de fazer as suas tarefas de amor como se fosse um anjo da cidade.
Nos anos finais da sua vida, com as patas rebentadas de tanto caminho, aceitou por fim ser adotado pela Elsa, benfeitora que lhe pegou ao colo e o levou para casa.
Muitos dos almadenses a quem Ladrão acompanhou durante a sua vida, com a ajuda de uma associação de proteção animal, juntaram dinheiro para que o bicho tivesse uma cadeirinha de rodas, uma Dog Locomotion que lhe permitiu continuar a andar.
3.
Sim, o Ladrão morreu faz dois agora dois anos.
Era o cão de todos, o mestre dos afetos, o que cuidava dos mais novos e dos mais velhos, um dos mais populares nas redes sociais onde a sua página de Facebook era visitada todos os dias por centenas de pessoas.
No dia em que Almada fez 50 anos, a presidente de câmara deu-lhe uma medalha – o primeiro cão da margem sul a ter as “chaves” da cidade.
O primeiro cão e o primeiro Ladrão…
… pelo menos o primeiro assumido.
Foi, é claro, o mais aplaudido.
4.
Adorava passear no Ginjal, cheirar a maresia do Tejo, passar por Cacilhas e pelas brasas perto dos restaurantes do Olho de Boi, fazer corridas consigo próprio, procurar ossos e novos amigos.
Quando os que o amavam o “adormeceram” já não andava e perdera o sorriso em alguma das ruas onde deixara de poder ir.
Adormeceu profundamente e acordou decerto no Paraíso dos Cães que ficam na história.
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