1.
O que impressiona em Rosa Mota é o compromisso e o respeito por si própria.
É que ela foi tudo e tudo conquistou – vitórias, honrarias, condecorações.
Tornou-se a melhor atleta da nossa história, a primeira mulher campeã olímpica, campeã do mundo, da Europa, figura acarinhada em vários países onde continua a ser uma estrela, no Japão, na Coreia do Sul, no Brasil, em tantos lugares.
2.
Podia ter descansado.
Podia ter-se retirado como os generais romanos para uma villa com boa comida, bom vinho, boas termas.
Podia ter renascido numa outra vida, engordado um bocadinho, deixado de correr, de se preocupar com o ser um exemplo para os outros, para os jovens.
Podia ter ido com o seu marido e treinador, José Pedrosa, para um outro lugar, abandonar a Foz e darem voltas ao mundo ou inventarem uma outra vida, sem obrigações, sem sacrifício, só a viver para o prazer de ver coisas bonitas, de comer coisas deliciosas.
3.
Podia ter deixado de fazer telefonemas para quem precisa de ouvir a sua voz.
De fazer visitas a pessoas em cuidados paliativos, de dar um abraço a enfermos, de se atormentar com as injustiças do mundo, com os pobres e sem-abrigos ao frio em janeiro.
Podia ter deixado de correr todos os dias.
De treinar como se continuasse a ser uma menina.
De sorrir como sempre sorriu a quem passa.
4.
Mas não.
Rosa Mota continua a respeitar-se a si própria e ao que conquistou.
Não lhe passa pela cabeça não ser uma campeã até ao último dia da sua vida.
Não lhe passa pela cabeça deixar de correr ou de falar da importância de nos mexermos, de não nos sedentarizarmos, de fazer um bocadinho mais em benefício da nossa saúde.
5.
E corre.
E sorri para as pessoas à beira da estrada.
E faz telefonemas e visitas.
E participa em provas.
E ganha.
E continua a bater recordes do mundo.
Bateu o recorde do mundo de 10 mil metros femininos para mulheres com mais de 65 anos.
Ninguém corre como ela.
Ninguém sorri como ela.
Uma gigante num corpo frágil de tão forte.